03 agosto, 2018

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LXXIII)

Não, não vi a entrevista (SIC) de Jair Besteiraro ao Roda Morta (assim mesmo, sr. revisor, porque Roda Viva era um programa de entrevistas onde o jornalismo imperava de verdade; a partir do momento em que o tucanato quebrou a espinha e a independência jornalística da TV Cultura e seu conselho curador baba-ovo do governador força indicação de nomes para serem entrevistados ou para realizarem a sabatina – inclusive amigos dos conselheiros ou do governante de plantão no Palácio dos Bandeirantes – passou a ser Roda Morta, quando não é Roda Presa – obrigado). Meu estômago não teria capacidade para tanto sal de fruta:

   - a sua visão torta sobre a escravidão: Os portugueses nem pisavam na África, os próprios negros que entregavam os escravos - Portugal manteve colônias na África entre 1415 e 1975 – Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe; fora outros territórios perdidos – Ceuta, em 1415, hoje enclave espanhol no Marrocos, e Costa do Ouro, depois colônia inglesa com o nome de Gana, independente desde 1960. Quase neste período (séculos XVI e XIX), quase 5 milhões de negros foram trazidos à força ao Brasil para serem escravos. Só alguns destes foram comprados através de acordos com reinos africanos – em guerra uns com os outros, principalmente nos séculos XVI e XVII, que escravizavam os guerreiros capturados ou derrotados. (Sim, neste minúsculo ponto Jair Besteiraro estava correto; só se esqueceu de dizer que, mais tarde, os próprios portugueses caçariam negros para escravizar e assim economizavam o dinheiro que gastavam com os reinos africanos que lhes vendiam cativos. Sem falar que os portugueses rasgariam tais acordos, e súditos destes reinos também seriam dominados... e escravizados.)
   - Que dívida histórica é essa que temos com os negros? – ora, a dívida que o Estado brasileiro tem com os afrodescendentes desde 1888, quando foram libertados – como questão de justiça, mas também como um "que-se-dane", sem mecanismos para educação, para formação profissional, para trabalho decente etc.
   - seu racismo: Não fui maldoso quando disse que um quilombola que pesava 7 arrobas não serve nem para procriarnãããão,imagine se fosse... Tanto que foi condenado pela justiça.
- sua homofobia: Não pode o pai chegar em casa, encontrar o Joãozinho de 6 anos de idade, brincando de boneca por influência da escola - e os garotos que brincavam de bonecos do Falcon, nos anos 1980, podiam? Besteiraro insiste em pensar que, se a escola explicar o que é sexualidade e homossexualidade, os meninos vão se deixar influenciar e virar gays... Vem cá, alguém influenciou algum menino de olhos pretos a ficar com olhos azuis naturalmente, sem lentes de contato? Ou algum menino a ficar careca naturalmente, sem raspá-lo com máquina zero?
   - sobre políticas para a combater a mortalidade infantil (Tem a ver com a questão da alimentação da mãe, muitas gestantes não fazem sua higiene bucal também – como se a miséria e a falta de saneamento básico não existissem e causassem isso...)
   - sobre sua ignorância em economia e sua política (ou falta de política) econômica: Paulo Guedes é o meu posto Ipiranga! – Paulo Guedes, colunista d'O Globo, é o orientador da política econômica de Jair Besteiraro, e talvez seja o seu ministro da Fazenda caso (aaaarrrrgggghhhh!!!!) o Coiso seja eleito presidente. Digo talvez porque, em sendo economista neoliberal roxo, Guedes defende a privatização geral de todas as estatais, do Banco do Brasil à Petrobras – ideia que (pelo menos há algum tempo atrás) Besteiraro era radicalmente contra.

Para o bem de nossos estômagos, já tá de bom tamanho, não é?
Então, vamos falar de um ser que é tão ou mais preocupante quanto Jair Besteiraro: o seu eleitor. Melhor dizendo: uma das categorias de seu eleitor.
Não me refiro às bolsonaretes fanáticas – as que defendem a ditadura e a tortura, que são tão misóginos e racistas como o próprio Besteiraro. Essas precisam de mais alfafa. Ou, pelo menos, de tratamento – seja psiquiátrico (para curar essa síndrome de Estocolmo), seja educativo-cultural (mais estudo de História). Até porque eles não são a maioria, e só querem briga, polêmica e barulho.
Eu me refiro a outro tipo de eleitor do Coiso-Ruim. É o eleitor totalmente desiludido com a política (não sem razão) e bastante assustado com um mundo que ele não entende, mas que só chega até ele na forma da violência.
A análise lúcida e pertinente é de Gustavo Gindre, via Facebook, que ainda lança o alerta: tratar este eleitor desiludido com os outros bolsonaretes fanáticos (isto é, como um fascista ou um debilóide) só vai empurrá-lo cada vez mais para o colo de Besteiraro. Pior: não há um discurso para contrapor a desilusão com o establishment político, porque este mesmo establishment, em grande parte, contrinuiu para esta mesma desilusão. Os últimos pregos neste possível caixão (me dói dizer isso, mas é verdade) foram do bom (bom?) e velho Centrão (é, aquele grupo de lobistas de interesses prá lá de escusos disfarçado de "políticos") e a esquerda – que não conseguiu desalojar esse mesmo Centrão e se uniu a ele em nome da "governabilidade" (de subilatório é ROLA! É ROLA!!!!).
Então, qual a saída para esta ameaça de Jair Besteiraro presidente?
O portão de embarque do aeroporto mais próximo?
Bem tentadora.
Mas não, ainda não.
Nos estreitos limites a que nos coagem as tenebrosas transações do Centrão, as saudades de viúvas da ditadura e o desencanto, ainda podemos nos mexer.
  
UM GUIA ANTI-BOLSONARO — Lucio Caramori (publicitário)

Resolvi usar minha experiência como redator publicitário e de campanhas eleitorais pra escrever um pequeno guia aqui: COMO DERROTAR JAIR BOLSONARO NAS ELEIÇÕES 2018. Veja bem: é a forma como EU vou abordar o assunto. Sinta-se à vontade para fazer ou não.
Primeiro e MAIS IMPORTANTE ponto: a luta não é para mudar a opinião dos Bolsonaristas. É PARA GANHAR OS INDECISOS. Desista de mudar o voto de quem age por ódio, e não razão. Melhor mostrar a quem não decidiu ainda o quanto a opção Bolsonaro é um retrocesso perigoso.
Por mais absurdo que seja, os comportamentos RACISTA, HOMOFÓBICO, VIOLENTO do candidato não me parecem os melhores argumentos contra ele. Infelizmente, existe uma tendência mundial em relevar essas atitudes. O que interessa é SEGURANÇA, EMPREGO, SAÚDE.
O argumento que ele não fez NADA pela segurança do Rio de Janeiro em 30 anos de mandato vai ser mais eficaz do que comentar que ele espancaria o próprio filho se fosse gay. Porque ele sempre se vendeu como pulso firme contra a violência e não como defensor de minorias.
Um tema que acho que pode ser uma exceção é o comportamento MISÓGINO dele. Mas, mesmo assim, me refiro à gravação onde ele diz que mulheres merecem ganhar menos no trabalho. Em uma época de crise dessas, nenhuma mulher escuta isso e acha bonito.
Esqueça essa bobagem de “Não fale do bicho papão que ele desaparece”. Os eleitores deles vão continuar berrando, espalhando ódio e convencendo os indecisos no grito. Precisamos ser uma voz CONTRÁRIA, DETERMINADA, LÚCIDA e INFORMATIVA. O silêncio, nesse caso, será nossa derrota.
Não saia do grupo de WhatsApp da Família, do Trabalho, do Prédio, do Clube por causa de radicais Bolsonaristas. Seja o contraponto. Seja a pessoa que combate as fake news com informação, que aponta o radicalismo, a hipocrisia, as promessas sem planos. E uma sugestão valiosa:
Esqueça a IRONIA, o SARCASMO. As pessoas entendem isso como prepotência. O que está acontecendo é muito sério e os indecisos precisam entender isso. Deixe para os Bolsonaristas a pecha de “zueiros” e aponte o dedo para eles para falar como essa “zueira” pode acabar com o país.
Esse último ponto tem muito a ver com minha lembrança de um debate entre o Cristovam Buarque e o Joaquim Roriz na minha cidade natal, Brasília. Cristovam ironizou o jeito tosco de Roriz falar. E isso pegou muito mal com o eleitorado mais simples.
Outra sugestão: não aponte outro candidato. Mostre como a preocupação maior é não permitir a eleição de Bolsonaro. Se ele cair no 1º turno, o segundo será entre duas visões de Brasil. Aí sim, cabe discussão. Bolsonaro não tem visão nenhuma.
Bolsonaro é uma ameaça SIM e não acredite em quem diz o contrário. Trump se elegeu por descuido de formadores de opinião que achavam sua candidatura um espetáculo para a mídia. 30% nas intenções de voto não é pouca coisa e brasileiro adora prestar atenção em quem está na frente.
Bolsonaro PRECISA ser derrotado no primeiro turno. E precisa cair MUITO para ter pouca influência no segundo. Acho que ele é a maior ameaça que a nossa democracia já enfrentou nesses 30 anos. E deve ser encarado como tal.

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30 de julho de 2018

#FicaADica.
Ou então tire seu passaporte e seu camarote de proa.

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Bom, para relaxar um pouquinho, vai aí uma sugestão de filme para esta séria série: The Miseducation of Cameron Post (EUA, 2018), de Desiree Akhavan, roteiro dela e de Cecilia Frugiuele, baseado no romance de Emily M. Danforth.
Pensilvânia, 1993. Uma adolescente – a personagem-título (Chloë Grace Moretz) – é flagrada namorando outra menina por seus guardiões conservadores. Daí, é forçada a entrar em um acampamento, onde funciona um centro de terapia de conversão (em português claro: "cura gay" – ou seja, aquela terapia semelhante às que convertem pessoas de olhos castanhos em pessoas de olhos azuis... sem lentes de contato coloridas, bem entendido...). No local, apesar da terrível realidade, ela conhece jovens como ela – especialmente Jane Fonda (Sasha Lane) – formando assim uma comunidade, e finalmente se encontra.
Fiquem com o trailer (e insistam com sua distribuidora favorita para trazer o filme para o Brasil) e até a próxima.