Diário do Bolso
(José Roberto Torero)
Hospital Alberto
Ainstein, 17h29 do dia 27 de março de 2019.
Diário, o
hospital é o meu lugar. Só aqui eu tenho sossego. Lá fora está uma bagunça, mas
aqui é tudo branquinho, cheirosinho, tranquilinho... Tomara que achem alguma
coisa para eu ficar mais uns dias internado. Os melhores dias do meu governo
foram aqui.
Olha só como estão as coisas:
o dólar aumentou 3%; o Ibovespa caiu 4,6%, e no Mackenzie, que tem fama de
direita, estavam preparando uma manifestação contra mim. Tive que me encontrar
com os pesquisadores no Comando Militar do Sudeste. Desse jeito só vou poder
visitar quartel.
E a coisa não
para por aí. O Olavo xinga o Maia, o Carluxo xinga o Maia, e até o Moro, em vez
de me ajudar, xinga o Maia (aliás, por que o Moro quer diminuir imposto de
cigarro? O que ele ganha com isso? Essa história não cheira bem. Onde tem
fumaça, tem fogo).
Olha, eu nem
posso ir ao cinema sossegado. Ontem, enquanto eu estava vendo um filminho, meu
governo levou uma tungada. O Maia colocou em votação uma lei que engessa ainda
mais o orçamento do executivo. Levamos uma goleada de uns 450 a 3. Pior que o 7
a 1 contra a Alemanha. Se isso não for barrado no Senado, só vou poder mexer em
3% do dinheiro.
Por causa disso,
o Paulo Guedes teve um chilique. Ontem nem foi no CCJ falar da Reforma da
Previdência. Poxa, o Posto Ipiranga não pode se negar a dar informação. Mas o
cara está tão fulo da vida que disse que pode até sair do governo.
É que nem a
Joice Hasselmann disse: querem afundar o avião!
O mais grave é
que na semana que vem pode ter outra pauta-bomba. Querem que o governo federal
reconheça uma dívida bilionária com os estados. Pô, bomba pra cima de mim? Eles
pensam que eu sou a Dilma de calças?
Tá difícil, viu?
Dizem que a política é um jogo de xadrez, mas eu só sei jogar truco, pô!
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PS: Diarinho,
minha única alegria é que a campanha para publicar você (https://www.kickante.com.br/campanhas/diario-do-bolso-100-dias) vai muito bem. Pensei que iam ser só
100 livrinhos, mas já são 226. Tomara que chegue aos 300. Se não der certo esse
negócio de ser presidente, acho que posso virar escritor.
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Ah, sim: antes de comemorarem junto com o Coiso o
aniversário do golpe militar de 1964 ("revolução" é a PQP!!!!),
sugiro duas leituras básicas.
A primeira leitura é um artigo de Eliane Brum para a edição brasileira d'El País (sim, ele mesmo, aquele grande jornal liberal
conservador espanhol, que os bolsonaretes acusam de ser... comunista...). Ainda
que fique longo, vão aí alguns trechos em que você, caro leitor, precisa MUITO
prestar atenção:
Uma pesquisa do Ibope
mostrou que Bolsonaro já é o presidente mais impopular em início de primeiro
mandato desde 1995. Os 89 milhões de brasileiros que não votaram em Bolsonaro,
seja porque votaram no candidato de oposição, seja porque se abstiveram de
votar ou votaram branco ou nulo, somados ao expressivo contingente que já se
arrependeu do voto no capitão reformado, terá que compreender que a luta pela
democracia é difícil – e não pode ser terceirizada. É isso. Ou aceitar que a
exceção, que já se infiltrou no cotidiano e avança rapidamente, siga tomando
conta da vida até o ponto em que já se tenha perdido inclusive o direito aos
fatos, como Bolsonaro e os militares pretendem neste 31 de Março.
Não queiram viver num país
em que a autoverdade, aquela que dá a cada um a prerrogativa de inventar seus
próprios fatos, impere. Bolsonaro e suas milícias digitais criaram a
autoverdade, mas ela só
será imposta a um país inteiro se a população brasileira se submeter a ela.
Afirmar que o golpe de 1964 não foi um golpe é mentira de quem ainda teme
responder pelos crimes que cometeu, como seus colegas responderam em países que
construíram democracias mais fortes e onde a população conhece a sua história.
Não há terror maior do que ser submetido a uma realidade sem lastro nos fatos,
uma narrativa construída por perversos. O corpo de cada um passa a pertencer
inteiramente aos carcereiros.
Bolsonaro precisa manter o
país queimando em ódio. Essa foi sua estratégia para ser eleito, essa segue
sendo a sua estratégia para se manter no poder. Ele não tem outra. Se deixar de
ser o incendiário que é e virar presidente, ele se arrisca a perder sua
popularidade. Sua estratégia é governar apenas para as suas milícias, capazes
de manter o terror, parte delas somente por diversão.
Depois de ser o candidato
“antissistema”, Bolsonaro é agora o antipresidente. Esta novidade, a do
antipresidente, é inédita no Brasil. O antipresidente Bolsonaro é aquele que
boicota seu próprio programa e enfraquece seu próprio ministério, mantendo,
também dentro do Governo, como definiu o jornalista Afonso Benites, a guerra do todos contra
todos.
Bolsonaro só pode existir
num país mergulhado numa guerra interna. Então, trata de alimentar essa guerra.
A determinação oficial de comemorar o golpe de 1964 é parte dessa estratégia.
Vamos ver o quanto os generais estrelados do seu governo são capazes de
enxergar a casca de banana. Ou se, ao contrário, escolherão deslizar por ela
apenas como desagravo aos anos em que ficaram acuados, temendo que o Brasil
finalmente fizesse justiça, julgando os crimes da ditadura como fizeram os
países vizinhos.
(...)
Com instituições fracas e
uma oposição sem projeto, diante de um governo em que o mais moderado é um
general que já defendeu um autogolpe com o apoio das Forças Armadas, a barbárie
dos dias se acentua. Tudo indica que vai piorar. Porque está piorando. A
incompetência explícita do bolsonarismo faz com que a necessidade de ampliar a violência
“contra todos os que não são iguais a mim”, com o objetivo de ampliar a
sensação de guerra interna, também aumente. Sem projeto consistente, o governo
que aí está só pode apostar no ódio para se manter. E vai seguir apostando. O
ódio não é o oposto do amor, mas sim da justiça. É justiça que Bolsonaro não
quer.
Os brasileiros vão precisar
compreender que a democracia terá que ser defendida por cada um, se colocando
junto com o outro. Às vezes só dá mesmo para gritar. Mas é preciso fazer um
esforço maior para responder com projetos, com propostas, com ação que não seja
apenas uma reação, mas uma alternativa que permita a vida e promova vida no
espaço público. Será assim, ou não será. Não é que tenha outro. Só tem você
mesmo. Com o outro.
(...)
Brasileiros de todas as
idades precisam aprender, pra ontem, com as gerações mais novas. É isso ou
seguir condenado a assistir à queda de braço entre Jair Bolsonaro e Rodrigo
Maia. Sério que é este o ponto alto do debate nacional, antes de vir outro do
mesmo nível ou pior? É este mesmo o nosso destino? Sério mesmo que o maior
crítico da militarização do governo é Olavo de Carvalho, por motivos bem outros
em sua calculada disputa de poder? E é ele o maior crítico porque parte dos que
poderiam criticar a militarização do governo por motivos legítimos e urgentes
começam a achar que Hamilton Mourão, o vice general, é uma graça? É assim mesmo
que vamos viver, esperando o que virá depois, caso exista um depois?
Boas leituras.
*********
Alyssa (Tania Nolan), uma fotógrafa de sucesso,
acorda uma manhã para encontrar seu apartamento saqueado e seu marido, Kevin (Jonathan
Flanagan) misteriosamente desaparecido. Deixada sem sequer uma fotografia para
oferecer a polícia, ela se vira para sua colega Eve (Rachel Crowl, atriz, musicista,
fotógrafa e designer trans), uma talentosa pianista de jazz com um charme de
flerte e graça desarmante. Eva a ajuda a confrontar a luta de longa data do
marido com a depressão e, com o tempo, aceitar sua ausência. Ao conhecer essa
mulher através de circunstâncias tão incomuns, Alyssa fica surpresa ao se ver
apaixonada novamente.
Leiam o artigo de Danielle Solzman para o blog Solzy at the movies (em inglês – sorry,
ou ponha o Google Tradutor para trabalhar...), que fala sobre o filme, vejam o trailer, e até a próxima.
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