10 novembro, 2014

CURTAS, MAS NÃO TÃO GROSSAS...

1- E o juiz João Carlos de Souza Correa, hein?
Para quem não está ligando o nome à pessoa, é o juiz que se acha deus (assim mesmo, sr. revisor, "deus" em minúscula, para não confundir com o outro, em maiúscula – obrigado), que processou a agente de trânsito Luciana Tamburini, só porque ela ousou para-lo em uma operação da Lei Seca. O fato do meretríssimo (assim mesmo, sr. revisor – obrigado) estar dirigindo um carro Land-Rover sem placas, sem documentos e sem carteira de habilitação – isto é, desobedecendo diversas leis de trânsito – pare ele, era um mero detalhe. Ruim mesmo, para o meretríssimo juiz, era o abuso daquerla tal de Luciana. Onde já se viu, parar um "deus" (assim mesmo, sr. revisor, em minúscula e entre aspas – obrigado) como se fosse um comum mortal?
A 36ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – que também deve ser composta por "deuses" – concordou com meretríssimo juiz. O desembargador José Carlos Paes – outro "deus" – também concordou. E Luciana, que cometeu o terrível crime de, simplesmente, cumprir seu dever de agente de trânsito, foi condenada a pagar a "ninharia" de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) de indenização por (não vale rir!) "danos morais" ao "deus" de toga.
O problema que os "deuses" protetores da carteirada e do "sabe-com-quem-está-falando" não esperavam era que os comuns mortais não ficassem conformados com isso. Como disse Cláudia Wallin, em um artigo para o Diário do Centro do Mundo, chamado O que aconteceria na Suécia com o juiz parado numa blitz no Rio?:

No Brasil, o êxito da "divina vaquinha", a campanha virtual organizada com a hashtag #juiznaoehdeus# a fim de coletar doações para o pagamento da multa imposta à agente do Detran, é um recado claro de que a sociedade está mais atenta aos seus direitos: ao lidar com o cidadão, a autoridade pública também precisa saber com quem está falando.

Ou seja, o pessoal já tá de saco cheio do "sabe-com-quem-está-falando", seja de políticos – que podem ser mandados para casa na próxima eleição (ou antes, via impeachment ou demissão) – seja de "deuses" de toga.
Quer dizer. O pessoal tá p... da vida. Menos uma pessoa: Alice Tamborindeguy, ex-deputada estadual... e ex-esposa do "deus" de toga em questão. Palavras dela (mais uma vez: não vale rir!):

"Não me dirigi a ela na ocasião, mas achei ela muito abusada e arrogante. Foi deboche. Ela parecia a “rainha da Lei Seca’’. Tem que cumprir a lei, mas sem destratar as pessoas. Se ela faz isso com um juiz, o que dirá com cidadão comum?

Vamos ver se entendemos, dona Alice. Seu ex-marido dirige um carro sem placas, sem documentos e sem a carteira de habilitação – isto é, desrespeitando o Código de Trânsito (uma lei!); depois, usa e abusa da carteirada e da autoridade, destratando e mandando prender uma agente de trânsito que, simplesmente estava cumprindo o seu dever... e é ela que é a abusada, dona Alice?
Depois não entende porque tem perdido as últimas eleições que disputou. Na última, tentou novamente ser deputada estadual, e obteve uma votação supimpa: 297 votos.
Isso, aliás, me lembra uma das eleições que essa senhora disputou. Mais especificamente, a primeira vez que concorreu à prefeitura de São Gonçalo, então pelo PSDB, em 1996. Já não estava indo muito bem, porque era candidata pelo partido do governador Marcello Alencar (aquela altura conhecido como "Família vende tudo" – será que ele inspirou o título do filme de Alain Fresnot?). Pois ela ainda se sai com esta pérola, dita para seus assessores (que vazou para o respeitável público eleitor): disse que estava preocupada porque São Gonçalo "era tão pobre que não tinha nem mesmo Mc Donalds"...
Quer dizer: com tantos problemas na época (e ainda hoje: a cidade cresceu, mas sua administração não acompanhou...) com água, esgoto e calçamento, o que mais preocupava a esposa do "deus" era a falta de um Mc Donalds em São Gonçalo. Isso numa época em que o eleitor levava muito a sério candidatos que se preocupavam com água, esgoto, calçamento etc.
Claro, perdeu aquela eleição feio.
(Aliás, a eleição de 2012 para prefeito de São Gonçalo também: não passou do 1º turno, com 15.494 votos.)
Por isso é que o eleitor de são Gonçalo imita aquele ilustre economista inglês (cujo nome não me lembro no momento) e, a cada eleição, diz à dona Alice: Go to the put a keep are you. (assim mesmo, sr. revisor, em inglês vulgar – obrigado)
Pano rápido.

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2- E prossegue a bolsa de apostas político-cultural, para ver quem será o próximo ministro da Cultura do segundo governo Dilma Rousseff, já que Marta "Relaxa e Goza" Suplicy está de saída do cargo. A classe artística – especialmente quem é ligado á preservação audiovisual, depois da crise artificial criada pela ministra dentro da Cinemateca Brasileira – e a moda – irritada pela concessão de lei Rouanet a desfiles de moda de estilistas conhecidos em Paris (em detrimento da Coopa-Roca, da Daspu e de novos estilistas) – penhorada, deseja à sra. futura ex-ministra uma boa viagem de volta ao Senado – só de ida.
O favorito de onze entre dez fazedores de atividades culturais é o ex-ministro Juca Ferreira, claro. Mas sempre tem gente jogando outros nomes ao ar, como pérolas aos porcos.
Agora, lá vem mais um nome para a bolsa de apostas: o compositor e cantor Chico César. Pelo menos, segundo notinha da coluna Gente Boa, d' O Grobo (assim mesmo, sr. revisor -  obrigado):

A ala do PT que em 2010 defendeu o nome de Ana de Hollanda no Ministério da Cultura levou para o Planalto a indicação de um novo ministro para a pasta, que, segundo eles, seria um consenso no setor: o cantor e compositor Chico César, atual secretário de Cultura da Paraíba.

Sobre esta novidade, que conste dos autos: adoro o cantor e compositor Chico César.
Mas não sei nada a respeito do gestor cultural Chico César.
Daí, seria importante saber como é a gestão de Chico César como secretário de Cultura da Paraíba.
Porque, como diz a notinha:
"A ala do PT que em 2010 defendeu o nome de Ana de Hollanda no Ministério da Cultura levou para o Planalto a indicação de um novo ministro para a pasta, que, segundo eles, seria um consenso no setor: o cantor e compositor Chico César, atual secretário de Cultura da Paraíba."
Repetindo (aos berros): A ALA DO PT QUE INDICOU PARA O MinC DONA ANA AUTISTA DE AMSTERDAM DE HOLLANDA.
Nem preciso lembrar a todos os retrocessos, os conflitos, as minimizações por parte desta ministra e seus asseclas (como Antônio Grassi, sua vingativa eminência parda) de reivindicações legítimas da classe cultural... enfim, a m... que deu.

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3- E, finalmente, saiu o resultado da licitação referente ao Centro Petrobras de Cinema. Mas este resultado, mais os acordos espúrios do presidente do Grupo Executivo do Caminho Niemeyer – eterno dono de algo em Niterói que (segundo ele próprio disse a testemunha confiável) não existe: a cultura – com um professor facilmente subornável (embora não o parecesse...) e um grupo minúsculo de audiovisual, ligado a um personagem apelidado (em homenagem a um personagem do filme Tropa de elite) de "Zero-Dois", para ignorar decisões da III Conferência Municipal de Cultura (disponíveis em seu relatório final) referente ao "rolo de filme" do mesmo Centro Petrobras de Cinema – especialmente um Centro Digital de Preservação Audiovisual (leiam os itens 14 e 28 do EIXO 2: Produção e Diversidades Culturais (NACIONAL: Produção Simbólica e Diversidade Cultural); e os itens 4 e 24 do 7.15 Grupo Setorial: CINEMA, VÍDEO E CULTURA DIGITAL – no relatório final da III Conferência) – eu comentarei com mais calma em outra ocasião.
(Minto. Falta fazer uma pergunta: o que adianta a sociedade civil fazer e participar de uma Conferência Municipal de Cultura, discutindo e aprovando propostas, se elas são solenemente ignoradas pelo poder público, que prefere ouvir somente o eterno dono da cultura de Niterói?)

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4- Finalmente: custou, mas estreia hoje, 10 de novembro, a 18ª edição do Festival Brasileiro de Cinema Universitário. Estão todos convidados.


07 novembro, 2014

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (XXXVII)

E, de repente, o grande assunto de nossa ilustre grande imprensa passou a ser um "casamento" entre duas mulheres.
Assim mesmo, sr. revisor, porque não é um casamento comum, de papel passado e tudo (direito, aliás, que os fiscais de fiofó alheios se esforçam para negar a casais do mesmo sexo, mas isso é outro assunto), obrigado.
O casamento a que nos referimos é o de duas ilustres hóspedes do sistema prisional brasileiro: Suzane von Richthofen e Sandra Regina Ruiz Gomes, mais conhecida como Sandrão. O que nos causa mais espécie é o destaque que órgãos como a Folha de S. Paulo, o Último Segundo, do iG e mesmo o G1, do Globo.com, deram ao caso.
Para quem voltou de Marte ontem, depois de 50 anos de residência no planeta, vamos aos personagens e detalhes desta história.
Suzane von Richthofen cumpre 39 anos de cadeia, como mentora do assassinato de seus pais – o engenheiro Manfred Albert von Richthofen e a psiquiatra Marísia von Richthofen – e está na cadeia há uns 12 anos. Neste período, a moça se tornou evangélica – inclusive morando na ala das evangélicas da prisão – e se tornou vítima de um boato que seria engraçadíssimo se não fosse de mau gosto: o de que seria nomeada para a presidência da Comissão daSeguridade Social e Família, por influência do pastor-depufede... digo, pastor-deputadoMarco (In)Feliciano – boato que, por increça que parível, muita gente levou a sério sem sequer botar o Tico e o Teco do cérebro para funcionar um pouquinho.
A história de Sandrão mostra que ela também égente muito fina. Em outubro de 2003 – quando ainda era conhecida como Galega – participou do sequestro de Talisson Vinicius da Silva Castro, de 14 anos, em Mogi das Cruzes (Grande São Paulo) com três homens. O pedido de resgate foi de R$ 40 mil, mas acabou reduzido para R$ 3.000. Quando a família efetuou o pagamento, o menino já estava morto com um tiro na cabeça. Para a polícia, o bando nunca teve a intenção de devolvê-lo com vida até porque ele conhecia os criminosos – o rapaz era vizinho de Sandra. Resultado: Sandrão foi condenada a 27 anos de prisão. A pena posteriormente foi reduzida a 24 anos.
Sandrão também é uma moça muito meiga e calma (atenção, turma que não usa o Tico e o Teco: isso é uma IRONIA...). "Hospedada" no centro de ressocialização de São José dos Campos, Sandrão encestou um agente penitenciário em fevereiro de 2011. Por esta "gentileza", ganhou mais uns três meses e 15 dias de detenção. No mesmo mês, foi transferida para a penitenciária de Tremembé.
O resto da história passa a ter detalhes de novela mexicana (ou, como prefere a turma do Tico e Teco sem funcionar, de filme erótico). Sandrão conheceu Elize Matsunaga – que está presa desde junho de 2012, quando matou e esquartejou Marcos Kitano Matsunaga, que, segundo a própria Elize, a humilhava com amantes e ameaças. (Eu até acredito nisso, mas, claro, nem por isso justifica) – as duas se "casaram" na cadeia e viviam felizes. Até a hora em que Suzane cruzou o caminho das duas.
(Antes de continuar, preciso explicar a quem ainda tem paciência de ler isso porque estou usando as palavras "casamento", "casaram", "casadas" sempre entre aspas. É que, basicamente, não é uma união civil passada em cartório – válida desde a decisão do Supremo Tribunal Federal, que substituiu o corpo mole de Suas Excelências, os deputados e senadores, para votar uma lei específica para tal – mas um documento de reconhecimento afetivo, válido somente para o sistema penitenciário de São Paulo. Com ele, presas que mantém relacionamentos amorosos podem viver numa ala da penitenciária de Tremembé, destinada a presas "casadas", que tem uma relação firme. Muderno esse sistema penitenciário paulista, não?)
Voltando a Suzane. Em agosto de 2014, Suzane foi beneficiada com a progressão da pena, do regime fechado para o regime semiaberto – isto é, com o direito de trabalhar durante o dia e dormir na prisão. A princípio, Suzane iria trabalhar como auxiliar no escritório de seu advogado de defesa, Denivaldo Barni. Só que, menos de uma semana depois, Suzane entrou com pedido à justiça para permanecer em regime fechado, lá mesmo na Penitenciária de Tremembé. Entre as alegações, está o temor de ser hostilizada em outro presídio – que já aconteceu quando se encontrava presa no Carandiru – e que necessita do salário que recebe por seu trabalho na oficina de confecção de roupas da penitenciária.
Quando Suzane anunciou seu "casamento" com Sandrão, todos – inclusive a justiça, presumo – entenderam por que.
A única coisa que eu acho chata nesta história é que Elize e Sandrão acabaram se separando por causa de Suzane, e a pobre Elize Matsunaga ficou a ver navios...
Como podem ver, não tenho nenhuma grande simpatia por Suzane e Sandrão, e tenho um pouquinho de simpatia por Elize Matsunaga. Mas não é por causa de minhas simpatias ou antipatias que estou escrevendo este texto. E não é só porque o escarcéu da chamada grande mídia em torno deste assunto já está enchendo o saco.
As três estão presas. Duas estão cumprindo pena por seus crimes, e a terceira aguarda julgamento.
E desde que paguem por seus crimes, as três tem o direito de viver como bem queiram entender.
Então (pausa para o berro internético), POR QUE CARGAS D'ÁGUA A IMPRENSA ESTÁ DANDO UMA DE FISCAL DO FIOFÓ ALHEIO PARA CIMA DELAS?
Bem, o nome Cesare Lombroso lhes diz alguma coisa?
Para quem voltou de Marte ontem etc., etc.: Cesare Lombroso (1835 - 1909) – psiquiatra, cirurgião, higienista, criminologista, antropólogo e cientista italiano – desenvolveu a teoria de que o criminoso é vítima principalmente de influências atávicas, isso é, uma regressão hereditária a estágios mais primitivos da evolução, justificando sua tese com base nos estudos científicos de Charles Darwin. Uma de suas conclusões é possibilitar a equivalência do criminoso a um doente que não pode responder por seus atos por lhe faltarem forças para lutar contra os ímpetos naturais.
Traduzindo em português ainda mais claro: foi ele que definiu em suas pesquisas que o crime é hereditário.
Algumas de suas teorias são citadas neste artigo:

Para começar, os criminosos seriam mais altos que a média (e isso significava 1,69m na Veneza e 1,70 na Inglaterra), teriam crânios menores que os dos homens “normais” e maiores do que os crânios dos “loucos”, além de uma aparência desagradável, mas não deformada, sendo que estupradores e sodomitas teriam feições feminilizadas.
Outras características comuns seriam orelhas de abano, nariz adunco, queixo protuberante,  maxilar largo, maçãs do rosto proeminentes, barba rala, cabelos revoltos, caninos bem desenvolvidos (olha só uma prerrogativa para vampiros aí), cabelos e olhos escuros. Ladrões teriam olhar esquivo, já os assassinos um olhar firme e vidrado. Seriam ainda especialmente insensíveis à dor.
Socialmente, criminosos teriam preferência por tatuagens o que provaria sua insensibilidade à dor. Os locais preferidos para tatuagens em geral (não necessariamente entre criminosos) seriam os ombros, o peito (marinheiros) a parte interna do braço e os dedos (mineiros). Criminosos teriam tatuagens nas costas ou nos genitais, muitas vezes denotando uma gangue ou imagens obscenas. Criminosos seriam ainda infantis, empáticos e extremamente vaidosos (a ponto de facilitar o trabalho de seus perseguidores) e um senso de moral extremamente apurado. Suas paixões exacerbadas que levariam a reações desproporcionais e criminosas às ações mais triviais. Isso sem contar seu interesse antinatural pelo mórbido.
Entre as mulheres, o que denotaria o potencial criminoso seria uma certa masculinidade nos traços e na voz, causados por um excesso de pelos corporais, verrugas, cordas vocais grossas com relação à laringe, mamilos pequenos ou muito grandes e mesmo sua forma de escrever. As mulheres criminosas seriam em geral mais cruéis que os homens, e possuiriam vitalidade, reflexos e força incomuns.
A leitura deste texto é revoltante não só por seus conteúdos, mas também pela apresentação falaciosa de dados e números. Lombroso parte de um modelo dedutivo e faz conclusões extrapolando em muito o significado dos números que ele mesmo apresenta. Mas a fisiognomia não era exclusividade deste autor. Ele cita diversos estudiosos em seu artigo que corroboram sua tese e alguns deles usam dados ainda menos precisos que os apresentados pelo italiano.

Isso lhe parece preconceituoso, caro leitor? Não, você não está errado: é preconceituoso mesmo. Tanto que a ciência criminológica moderna não lhes dá muito valor hoje em dia. Mas ainda tem gente (essa mesma cujo Tico e o Teco não funciona direito) que ainda lhes dá crédito.
Pior: como o crime é uma circunstância natural por ser de caráter primariamente hereditário, porém inaceitável socialmente, Lombroso era favorável à pena de morte e prisão perpétua. (Ver "As mais recentes descobertas e aplicações da psiquiatria e antropologia criminal" de 1893).
Pior ainda, repetindo um trecho do artigo (e é isso que nos interessa nesta séria série):

(...) estupradores e sodomitas teriam feições feminilizadas.

Para quem não sabe o que é isso, breve consulta a um pai dos burros:

Sodomia
s.f. Relação sexual anal entre pessoas do sexo masculino ou entre um homem e uma mulher.
(Etm. do latim: sodomia)

E para quem ainda não percebeu (por falta de uso do Tico e do Teco): Lombroso atuou na Europa do século XIX. E nesta época – com a honrosa exceção da França, graças ao Código Napoleônico, especialmente durante a Terceira República (1870 a 1940) – a homossexualidade – chamada de sodomia – era crime nos códigos penais europeus.
Relembrando: ainda tem gente que leva a sério as teorias preconceituosas de Lombroso, como se fossem as tábuas da lei.
Daí, o resultado desta equação simples:

Escarcéu da imprensa sobre o "casamento" de Suzane com Sandrão + Resquícios da teoria-preconceito lombrosiana na cabeça da turma do Tico e Teco com defeito + Homossexualidade chamada de sodomia = PRECONCEITO A SER USADO CONTRA O POVO LGBT.

Lembram do patrono desta séria série e de certos pastores, como Marco (IN)Feliciano, Silas Mala-Sem-Alça-Faia et caterva, relacionando a homossexualidade à pedofilia? Pois é.
Alguém já viu, por exemplo, alguns filmes brasileiros, produzidos na chamada Boca do Lixo? Se me permitem o cabotinismo, citei alguns em um artigo que escrevi há algum tempo para osite de cinema Cinequanon, sobre apresença das personagens lésbicas no cinema, onde falei de alguns estereótipos negativos em relação às lésbicas. O pior deles foi a lésbica criminosa – a filha putativa do casamento entre o lombrosianismo e a pior psicanálise de botequim, que decreta peremptoriamente o lesbianismo como uma característica determinante para levar certas mulheres ao crime. Alguns exemplos desta "inteligente" teoria aplicados ao Cinema brasileiro, citados em A personagem homossexual no Cinema brasileiro, de Antônio Moreno (Rio de Janeiro / Niterói, Funarte / EDUFF, 2001):

- Em A gata devassa (Rafaele Rossi, 1974), as duas únicas personagens lésbicas são ligadas à cúpula de uma organização criminosa internacional.
- Em Um corpo de mulher (Hércules Breseghelo, 1979), a polícia investiga uma série de assassinatos de modelos que trabalharam para um fotógrafo, que se torna o principal suspeito... até que se descobre quem foi: a irmã do fotógrafo, uma (já adivinhou?) lésbica.
- Isso sem nos esquecermos do ambiente presidiário e afins: tanto o presídio feminino de As depravadas (Geraldo Miranda, 1977) – de onde um grupo de presas foge e barbariza geral –, quanto o reformatório feminino de Internato de meninas virgens (Osvaldo de Oliveira, 1977) não são apenas escolas de criminalidade, mas de "depravação"...

Então, imaginem. E se o Tico e o Teco com defeito de várias pessoas que ainda levam Lombroso a sério confunde estas obras de ficção com a realidade?

Daí, alguns conselhos de amigo:
1- Suzane e Sandrão não estão na cadeia, cumprindo suas penas? Então deixa elas quietas e não encha o saco, porra...
2- Antes que alguém use este "casamento" entre Suzane e Sandrão para, mais uma vez, relacionar homossexualidade com criminalidade, seria interessante que fosse seguido um conselho dado pela Revista de antropofagia, "1ª dentição", em seu editorial do nº 3, de julho de 1928:

"Daí o melhor é por a carniça num tanque de creolina e recambiá-la para a Europa. Com a seguinte mensagem: 'Preferimos sardinha'. Que marca vocês querem? Amieux, Philippe & Canaud ou aquela de saudosa memória D. Pero Fernandes, inexplicavelmente desaparecida do mercado desde 1556?"

(Para ser honesto: na verdade, a carniça a qual eles se referem é a filosofia positivista. Mas serve também para a carniça preconceituosa lombrosiana.)

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E já que o crime foi o mote para este texto desta séria série, vai aí mais uma indicação minha, que já foi lançado nos cinemas brasileiros, mas merece ser visto de novo: Versos de um crime (Kill your darlings - EUA, 2013), de John Krokidas.
Na verdade, o filme tem duas razões para ser visto.
Uma é pela curiosidade de muitos fãs da série Harry Potter: foi o primeiro grande papel adulto de Daniel Radcliffe depois que ele deixou definitivamente de ser aquele simpático bruxinho da Escócia. E ele pega justamente um papel suculento: Allen Ginsberg (1926 - 1997) – um dos grandes nomes da geração beat – quando jovem.
O que nos leva ao segundo fato, histórico-cultural: o filme trata justamente do encontro entre os três nomes mais importantes desta geração beat: Ginsberg, Jack Kerouac (1922 - 1969) e William Burroughs (1914 - 1997)infelizmente, em torno de um crime.
A historinha: em 1944, Allen Ginsberg sai da casa dos pais rumo à universidade, precisando lidar com o sentimento de culpa por ter deixado sua mãe, Naomi (Jennifer Jason Leigh), que tem problemas psicológicos. Seu sonho é tornar-se um escritor, mas logo sente-se incomodado pelo modelo "certinho" de poesia que o curso ensina. Não demora muito para que ele conheça Lucien Carr (Dane DeHaan), um jovem provocador que apresenta Allen ao mundo da contracultura – e, por tabela, a Jack Kerouac (Jack Huston – que, aliás, não nega a herança artística, já que seu avô paterno é o cineasta John Huston – 1906-1987) e William Burroughs (Ben Foster).
Logo nasce uma grande amizade entre os dois, que se torna algo mais quando Allen passa a sentir atração por Lucien. O problema é que já havia alguém apaixonado por Lucien: um professor chamado David Kammerer (Michael C. Hall – sim, ele mesmo, o serial killer "do bem" Dexter, da série homônima, e também ator da série Six feet under / A sete palmos).
O que acontece depois? Bem, sugiro que você assista o filme quando for lançado em DVD ou Blu-Ray. Por ora, fique com o trailer.