13 junho, 2018

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LXXI)

Antes de entrar no assunto em pauta desta séria série, permitam-me transmitir um breve recado à reitoria, pró-reitorias e, principalmente, coordenadores de seus cursos de ciências jurídicas (Direito, para ser mais claro) da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ):
Se não for muito difícil, gostaria que reforçassem, em seus cursos de direito, o ensino das leis de combate ao racismo e suas consequências, tanto penais – Artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal, que trata de injúria racial, punida com reclusão de um a três anos e multa, além da pena correspondente à violência, para quem cometê-la, e a Lei n. 7.716/1989 quanto sociais.
De preferência, gostaria que tais aulas fossem reforçadas para valer para o grupo de estudantes de Direito da PUC-RJ que foram torcer nos Jogos Jurídicos Estudantis, em Petrópolis (RJ), que terminaram no último dia 3 de junho. E que terminaram com demonstrações explícitas de racismo dos estudantes de Vossa PUC-RJ contra alunos de direito da UERJ, Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade Católica de Petrópolis (UCP – ou seja, nenhuma sororidade entre as universidades católicas...): os moços jogaram bananas na quadra e imitaram macacos – cretinice que chegou ao clímax (é força de expressão, porque racismo é brochante...), principalmente durante a final do handebol feminino entre PUC-RJ e UFF chamaram as atletas da UFF afrodescendentes de"macacas". (Se essa ideia de jerico – no mínimo – foi para atrapalhar o jogo, não adiantou nada: o time da UFF ganhou.)
Isso, meus senhores, é muito importante para eles próprios, os estudantes da PUC-RJ: evita, no mínimo, que em um futuro, eles deixem de passar vergonha tanto no débito como no crédito, como agora.
No débito porque as outras universidades estão deitando e rolando em cima dos senhores, entre gozações do tipo Já dizia o ditado dos old times do direito uff:"Na PUC só tem cuzão" kkkk e protestos contundentes, como mostram os vídeos abaixo:



E no crédito porque, além de perderem o título geral e ficarem de fora próximos dos Jogos Jurídicos, ganharem de "presente" uma sindicância interna da própria PUC-RJ e uma nota oficial de protesto, assinada por juízes afrodescendentes, ainda tem as consequências sociais que já lhe falei: a menos que o dono seja um bolsonarete, qual escritório de advocacia vai contratar uma besta quadrada destas? (E, para efeito na vida privada: qual moça ou rapaz vai namorar um/uma imbecil deste quilate-mas-não-morde?)
Fora o dano para a própria imagem da PUC-RJ, já muito arranhada por casos de racismo dentro dela – apesar de seu pioneirismo referente à inclusão social, como os senhores mesmos relembram em sua nota oficial a respeito:

Permanecemos fieis ao pioneirismo na promoção da diversidade e da igualdade racial, pois foi a PUC-Rio o berço dos pré-vestibulares comunitários para negros e carentes, a primeira instituição particular brasileira a instituir política de acesso e permanência de alunos negros e carentes, mediante concessão de bolsas de estudo, auxílio financeiro para custeio de despesas de alunos bolsistas, por meio do programa FESP (Fundo Emergencial de Solidariedade da PUC-Rio) e a primeira instituição a oferecer disciplina na graduação sobre ações afirmativas.

Não só o racismo arranha a imagem dos cursos da PUC-RJ: o seu curso de economia já teve sua imagem bem arranhada pelo febeapá cometido pela ekipekonomica (copyright Elio Gaspari) de FHC (leia-se: populismo cambial), nos anos 1990 – que incluía quadros deste nobre curso, como Gustavo Franco e Pedro Malan. Os senhores não vão querer que seu curso de direito sofra o mesmo desprestígio, não é mesmo?

Sem mais para o momento,
Obrigado de nada.

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Ah, sim, por falar em Jogos Estudantis: sabiam que houve um casamento entre duas estudantes da UFF, Larissa Maia e Vanessa Faria,durante os Jogos Universitários de Comunicação Social (JUCS), que aconteceram em Vassouras (RJ), no feriado de Corpus Christi deste ano de 2018? 
Pois é. Isso ainda merecerá um novo post desta séria série. Por enquanto, ficamos com o fato: como os JUCS parecem diferentes em sua mentalidade, em comparação com os Jogos Jurídicos, né não?

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Dados os breves recados, voltemos à vaca fria.

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Moça, você é machista.
Não, não estou falando da gentil e combativa leitora que por acaso deve estar lendo estas mal traçadas linhas.
É que me lembrei de uma página no Facebook com este nome ao ler esta notinha publicada na coluna do Ancelmo Gois n' O Globo  (aconselho, aliás, à gentil e combativa leitora que coloque um copo d'água e sal de frutas à sua disposição, após acabar de ler):

ELEITORA DO BOLSONARO
Desembargadora que insultou Marielle agora dispara contra as feministas
POR ANCELMO GOIS
04/06/2018 06:15

Reprodução da publicação da magistrada | Reprodução

A desembargadora do Rio Marília Castro Neves, que divulgou calúnia contra Marielle, voltou a disparar farpa no Facebook. Num post, ela, que se declara eleitora de Bolsonaro, pede que, caso venha a morrer, ninguém permita que sua morte seja usada pelas Feminazis (uma mistura de feminista com nazista) “como bandeira para sua causa perdida”.

Isso me leva um pedido ainda mais importante: alguém que possa me ajudar a responder três perguntas básicas.
Primeira pergunta: o que levam várias mulheres (a "gentil" – assim mesmo, entre aspas, obrigado – desembargadora é apenas uma delas) a ser ainda mais machistas, porco-chauvinistas e antifeminismo do que os homens?
Pessoalmente, tenho várias teorias. Talvez seja uma síndrome de Estocolmo piorada – cortesia (talvez) de uma didática secular (ou milenar) que parece ensinar o oprimido a amar tanto a ideologia do opressor que passa a defende-la com unhas e dentes e com mais ênfase do que o próprio opressor). Ou então a "gentil" desembargadora tenha maratonado The Handmaid's Tale (sim, porque ler o livro acho meio impensável em se tratando de pessoas deste quilate-mas-não-morde...) e concluiu que este seria o mundo ideal para que mulheres como ela devam viver...
Porque eu não entendo como podem ter mulheres que são contra o feminismo – que, se não me engano (gostaria que as gentis e combativas leitoras me esclarecessem, para que eu não pague um king kong neste texto), é a luta de mulheres por direitos iguais na sociedade – a ponto de incorporar conceitos (eu disse "conceitos"? Mil desculpas. É que eu estava indeciso entre "Preconceitos" e "ideias de jerico", o que para mim são a mesma coisa...) inventados principalmente por machistas, porco-chauvinistas e evangelicuzinhos fundamentalistas e aplaudidos por bolsonaretes para desqualificar a luta das mulheres e, quem sabe, tirar os direitos que conseguiram até agora.
"Feminazi", por exemplo: o "nazi" implica em afirmar que as reivindicações feministas por igualdade estão sendo impostas ditatorialmente – e não é, nem nunca foi o caso. (Fora outros "febeapás" que acompanham este termo cretino: desde quando, para ser feminista e lutar pelos direitos das mulheres, é preciso não cuidar de sua aparência? Feministas também se depilam, se maquiam, e, querendo, tingem o cabelo de louro e fazem plástica. Ainda mais quando o objetivo de uma mulher é manter sua autoestima, não para "conquistar um marido" – assim mesmo, sr. revisor, entre aspas, obrigado. E, da mesma forma, tem mulher que mantém sua autoestima sem se pintar, maquiar etc. – afinal, quanto menos for obrigatório para uma mulher, melhor. Será que machistas, porco-chauvinistas, evangelicuzinhos fundamentalistas e bolsonaretes já ouviram falar de livre escolha?)
O problema é que – pelo menos nos últimos 500 anos de civilização humana – o que mais foi imposto na marra foi, justamente, uma noção de "superioridade" do homem, o que, "justificava" (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas, obrigado) mil e uma limitações e proibições à mulher, para que ela se limitasse a "cumprir seu único papel na sociedade (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas de novo, obrigado): casar, cuidar da casa, transar com o marido sempre que ELE quisesse e parir filhos. E o problema 2, a missão (e parece que a "gentil" desembargadora se esquece disso), é que, se tais proibições vigorassem até hoje, ela nem sequer teria direito a dar opinião – como aliás, Carol Patrocínio informa a "moças de família" (SIC) como a "gentil" desembargadora, em um texto muito instrutivo, "9 Coisas Que As Vadias/Barangas Feministas Conquistaram Para Você, Inclusive Pras Anti-Feministas" (Calma: esse é o título do texto, em chave de IRONIA):

É fácil dizer que você é feminina e não feminista – porque você nem nota o quão sem sentido é dizer isso –, que feministas são mulher mal comidas que não melhoraram em nada a sua vida ou que as lutas do movimento feminista são inúteis. Difícil, amigas, é abrir mão das coisas que o movimento feminista te deu de presente.

1 – A possibilidade de ter opinião
Sabe quem lutou e mudou as coisas para que você possa ser anti-feminista? As feministas! O mundo é realmente engraçado, né?

2 – Poder vestir calças compridas
Olhe para suas perninhas: tem uma bela calça quentinha aí? Pois é, foram as feministas que permitiram que você pudesse escolher não usar saia – e usar a saia no comprimento que bem entender.

3 – A chance de trabalhar
Onde você está agora? No trabalho. É… foram elas, as feministas do passado, que deram um jeito de você poder trabalhar no que gosta. É claro que trabalhar, por si só, foi uma necessidade do mercado, mas poder escolher? Ah, isso foram elas. E no fim é o mais importante, né?

4 – A possibilidade de escolher com quem quer se casar
Antes você seria vendida pela sua família. Tudo se basearia em interesses e negócios. Puro business. Você seria só mais um produto que poderia garantir mais dinheiro para a família, sem sentimentos, sem desejos, sem ação ou agência. Não é uma delícia poder escolher por si mesma?

5 – O direito de amar quem quiser
Essa coisa de amor é demais, né? Deixa o coração quentinho ter ao lado alguém que se importa com a gente, nos respeita e olha para nós como os seres humanos incríveis que somos. Coisa de feminista, preciso dizer.

6 – Uma lei que te defende de agressores
Maria da Penha é uma lei que inspira políticos do mundo todo, sabia? Ela diz que nenhum cara pode encher a mulher de porrada e sair ileso. É um avanço incrível para uma sociedade que até outro dia achava que mulher era posse. Os esforços foram feministas.

7 – Poder gostar de sexo
Imagina só, antes do movimento feminista, dizer que você gosta de sexo? Seria um escândalo e talvez você fosse apedrejada em praça pública. Mas hoje… Hoje você pode gostar de sexo, se divertir com isso e ainda pode escolher com quem vai transar. Mágico, né?

8 – A possibilidade de não engravidar mesmo fazendo sexo
Incrível, né? Revolucionária essa coisa da pílula anticoncepcional e a possibilidade de transar apenas por prazer. Feministas tiveram um dedo aí, tá?

9 – Direito ao voto
Coisa da Bertha Lutz, uma feminista. Antes os homens votavam por nós porque representavam os nossos interesses. Ahan.

Tudo isso é apenas uma parte do que o movimento feminista lutou para que todas as mulheres tivessem acesso, algumas das coisas que mais nos tornam livres hoje em dia foram resultado direto ou indireto dessas movimentações.

Posso acrescentar (só para dar um exemplo) mais uma coisa? Não fosse o feminismo, as mulheres nem sequer poderiam estudar em universidades. (Sério: no século XIX, mulheres não entravam nas faculdades. Maria Augusta Generoso Estrela, a primeira mulher a se formar médica no Brasil Império, só o conseguiu estudando... em uma universidade dos EUA). E Rita Lobato, a primeira mulher a entrar numa faculdade de medicina brasileira, só o conseguiu em 1883, após o decreto imperial nº 7247, em 19 de abril de 1879, de D. Pedro II.
Ou seja: mantidas tais proibições, a "gentil" desembargadora, por exemplo, nunca poderia cursar Direito, nunca poderia entrar para a magistratura, e nunca chegaria a ser desembargadora e ganhar a posição que lhe dá destaque aos seus despautérios. Teria ela pensado nisso?

Segunda pergunta: o que levam algumas pessoas a ter essa incontinência verbal que as leva a falar antes de pensar?
Sim, porque isso já me parece um caso psicológico (pra não dizer psiquiátrico). Salvo engano, todos os seres da espécie Homo sapiens costumam pensar antes de fazer qualquer coisa – inclusive falar. Neste último caso, também costumam observar as coisas em sua volta antes de pensar e proferir uma opinião.
Pois parece que isso está mudando com a internet (e as redes sociais, em particular). Nelas, parece que a necessidade de digitar alguma coisa rapidamente está suplantando a capacidade de raciocinar antes. É isso mesmo, produção?
Ou será que meu amigo Gustavo Gindre tem razão ao achar que estamos construindo personalidades cindidas, como se fossem dois mundos diferentes, e que a facilidade que as pessoas têm para ofender e agredir nas redes sociais não é transposta para a vida lá fora? Tipo assim, dupla personalidade à lá Bezerra da Silva: nas redes sociais "é um bicho feroz": fora delas, "anda rebolando e até muda de voz" (no sentido figurado... calma aí...)?
Se for assim, não se Freud ou Jung explicariam isso.

O que nos leva a terceira pergunta: por que é que o poder judiciário brasileiro, além de exigir dos candidatos a magistrados o de sempre – notório saber jurídico e reputação ilibada – não exige também exames psicológicos (tanto na época da nomeação, quanto periódicos, de quatro em quatro anos), para auferir se o candidato a magistrado tem equilíbrio mental e emocional para aplicar a lei?
Se ainda não sabem, dir-lhes-ei (copyright Jânio Quadros): sou contra a adoção legal da pena de morte no Brasil. (E também sou contra a pena de morte ilegal que traficantes e milicianos aplicam ao arrepio da lei.) Mas sabem como é, sempre tem outros imbecis defendendo a adoção da pena capital, dizendo que lá na Indonésia e nos EUA isso resolve a criminalidade, sem sequer observar que:

1- Se a criminalidade diminuiu nos EUA nos anos iniciais a partir de 1977, quando a pena de morte voltou a vigorar, atualmente os índices de criminalidade estão bem altos; e
2- Desde os tempos do ditador Suharto que a Indonésia não é nenhum modelo de combate à corrupção. Ou seja, se qualquer otário que chega ao país com maconha ou cocaína malocado na bagagem é passado nas armas (tradução: fuzilado), quem me garante que grandes chefes de carteis de drogas (logo, donos de recursos financeiros enormes à disposição do "faz-me rir" habitual das "otoridades" indonésias) que atuam por lá são sequer incomodados?
Pois então, já que supunhetamos no assunto (copyright Aldir Blanc), vai que um dia um Congresso Nacional ainda mais conservador do que o atual aprove a pena de morte. Para julgar uma pena assim definitiva (porque futuras anistias e revisões de pena para quem for condenado à morte injustamente – sim, gentis leitoras e leitores, a justiça erra – só poderão ser póstumas, já que a vida do condenado não poderá ser devolvida) é preciso que um juiz observe minuciosamente os autos do processo e, sobretudo, tenha equilíbrio.
Então, imagine um processo de pena de morte examinado e julgado por juízes como a "gentil" desembargadora. Que, aliás, não é única representante dos porraloucas no poder judiciário. Ou por aquele "meretríssimo" juiz que se julgava Deus – é, aquele mesmo que processou uma agente de trânsito que teve a "ousadia" de multa-lo, só porque estava dirigindo um carro sem placas e sem a carteira de motorista, que havia sido apreendida faz tempo. (E, pior, que ganhou o processo em duas instâncias – cortesia do esprit de corps, d'aprés esprit de cochon, do judiciário fluminense?).
Ou por este juiz que mandou bala (mesmo: tiros e mais tiros, já que juízes tem o privilégio de portar armas) em seu vizinho de condomínio:

O osteopata Pedro Augusto Guerra fica ofegante ao se lembrar de um tiro que, por pouco, não o atingiu na cabeça. E se mostra indignado ao contar que, segundo ele, o disparo foi feito pelo juiz Jorge Jansen Counago Novelle, da 15ª Vara Cível do Rio, dentro de um condomínio de frente para o mar na Avenida Atlântica, em Copacabana. O ataque, ocorrido por volta das 4h do feriado de 1º de maio, foi registrado com a câmera de um celular. A motivação ainda é desconhecida.
O vídeo mostra o instante em que o tiro é disparado, após uma discussão entre o osteopata e o juiz. O caso só não terminou em tragédia porque a bala desviou na grade de uma janela, abrindo, em seguida, um buraco na parede do edifício.
Os dois eram vizinhos. O juiz ainda mora no condomínio; já o osteopata saiu do prédio. Pedro alugava um imóvel de cerca de 400 metros quadrados, um andar abaixo da casa de Novelle. Pelo vão interno de circulação de ar do edifício, um podia ver parte do apartamento do outro. E foi nesse espaço que ocorreu o incidente, filmado pelo osteopata. Na gravação, enquanto Pedro apoia o celular no parapeito de uma janela, escuta-se um grito que seria do juiz: “Bandido!”. Depois, o magistrado aparece na imagem, na área de serviço de seu apartamento, e faz acusações contra o osteopata. “Tu é safado. Pedro safado!”, diz ele.
Logo em seguida, Novelle sai, e ressurge 12 segundos depois. “Tu vai me filmar? Tá me ameaçando?”, questiona o juiz, que aponta uma arma para a janela de Pedro. “Então, tome bala”, avisa ele ao atirar. O osteopata afirma que estava com a cabeça para fora da janela enquanto filmava. Após o disparo, o celular continuou apoiado no parapeito, mas Pedro caiu no chão.
(…)
Novelle, por sua vez, não quis se manifestar. Na última sexta-feira pela manhã, uma equipe do GLOBO o procurou em seu apartamento. Pelo telefone da portaria do prédio, ele disse que só se pronunciaria em juízo.

Já imaginou?
Pois é.
Imagine um juiz com o equilíbrio emocional dos acima citados decidir se um réu vive ou morre.
Já é ruim quando decidem sentenças sob a legislação atual com suas neuras, idiossincrasias e crenças escondidas atrás da letra fria da lei – tipo assim, aquele juiz de Goiás que mandou a resolução do CNJ às favas e proibiu os cartórios do estado de realizarem casamentos entre pessoas do mesmo sexo... – juiz que, por curiosa coincidência, também era pastor da Assembleia de Deus. Dir-se-ia, até, que usam a jurisprudência do juiz norteamericano Webster Thayer, que julgou os imigrantes italianos Sacco e Vanzetti de modo imparcial... (só que não) para tomar suas decisões.
Imagine um caso de pena capital, caso venha a ser adotada aqui em Terra Papagalli...

Estas são as três perguntas. Se alguém puder me responder, me escreva.
Quanto à "gentil" (e sem noção) desembargadora, um fato é claro: será que foi realmente necessário a "gentil" (e idiota) desembargadora cometer essa nova tuitada ofensiva e sem noção (imagine, votar em um candidato misógino, que odeia as mulheres – se não for por ser narniano roxo...)? Será que alguém, realmente, lamentará a morte dela? (De velha, por causas naturais, claro. Primeiro, porque somos contra a violência; segundo, porque não somos tão escrotos a ponto de desejar a ela o mesmo que deseja a outras mulheres.)
Quanto à causa que a "gentil" (e não solidária) desembargadora acha que é perdida – o feminismo – dois lembretes. Um de Oswald de Andrade (que eu costumo apelidar de "o homem que amava as mulheres independentes" – tanto que, em sua vida, se uniu a três ou quatro que não eram nem um pouco submissas): Seja como for. Voltar para trás é que é impossível. O meu relógio anda sempre para a frente. A História também.
O segundo, de Mlle. Simone de Beauvoir: Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre. Porque alguém disse e eu concordo que o tempo cura, que a mágoa passa, que decepção não mata. E que a vida sempre, sempre continua.

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Quase que eu me esqueço: Simone de Beauvoir foi tema da redação do ENEM de 2015 e deu muito o que falar – especialmente para quem não entendeu sua frase famosa de sua obra O Segundo sexo (e nem se esforça em entender – evangelicuzinhos, bolsonaretes e catervada), muito menos a diferença que mlle. Beauvoir destaca nesta frase entre o papel biológico e o papel social da mulher: Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam o feminino.

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Tá bom. Para não magoar muito a "gentil" (e porralouquíssima) desembargadora, a minha indicação para esta séria série talvez a agrade: Colette (Colette – EUA / Hungria / Reino Unido, 2018), de Wash Westmoreland.
Para quem é versado em literatura e em história da literatura, o filme é baseado em fatos da vida de Sidonie-Gabrielle Colette (1873-1954), uma das maiores escritoras francesas.
Por que tal indicação talvez a agrade a "gentil" (e idiotíssima) desembargadora?
Talvez porque Colette nunca foi, de facto (copyright português da República Portuguesa...) uma militante feminista – ou melhor dizendo, sufragista: a principal luta das mulheres em fins dos século XIX e início do século XX (entre outras tantas, sejamos sinceros...) era pelo direito de votar e serem votadas em eleições.
Breve aula: não que as francesas não tenham tentado. Em plena Revolução Francesa, uma dama chamada Olympe de Gouges (1748-1793) escreveu diversos textos em defesa de direitos políticos para as mulheres, inclusive a sua Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã (1791), Mas sabem com eram os liberais da época revolucionária – e mesmo de hoje, principalmente aqui em Terra Papagalli: liberdade ma non tropo: "os deveres de mãe e esposa são incompatíveis com o exercício dos direitos políticos", "As mulheres são muito influenciadas pela Igreja, e isso contraria o ideal de Estado laico" (como se não existissem mulheres em todas as épocas que mandavam dogmas e proibições religiosas pras cinco letras que fedem...), blá, blá, blá, blá, blá, blá... Conclusão: ao invés de dar às mulheres o direito de subir à tribuna, preferiram levar Mme. de Gouges à guilhotina, em 1793. Conclusão: enquanto outros países atendiam à pressão de suas mulheres e lhes concediam direitos políticos (mais ou menos nesta ordem: a Nova Zelândia – o primeiro, em 1893, fruto de movimento liderado por Kate Sheppard; a Austrália, em 1902; a Finlândia, ainda domínio do czar da Rússia, mas já botando as manguinhas de fora em busca de sua independência, em 1906; a Dinamarca e na Islândia (território dinamarquês) , em 1915; a Alemanha, em 1918 (após a queda do kaiser e a instauração da República de Weimar); o Reino Unido, em 1918, ampliado em 1928; os EUA, em 1919; a Suécia – 1921; o Equador, em 1929; e a Espanha, em 1931, com a Segunda República), a França só veio dar voto às mulheres em 1945, depois da Segunda Guerra Mundial. Até o Brasil passou à frente da França ("A Europa curvou-se ante o Brasil!") estabelecendo o voto feminino em 1932.
Pior. Na época em que madame Colette viveu, as mulheres eram submetidas aos ditames do Código Napoleônico, promulgado (como o nome diz) durante o reinado de Napoleão Bonaparte (1804 a 1814). Um artigo do historiador Augusto Buonicore, chamado O antifeminismo na história nos informa o que este Código oferecia às mulheres:

A consolidação da derrota das mulheres se deu com a aprovação dos Códigos Civil e Penal, aprovados respectivamente em 1804 e 1808, já sob o governo de Napoleão Bonaparte. Neles se restabelecia o princípio de que “a mulher deve obediência ao homem”. O marido passava a ter legalmente, entre outras coisas, o direito de exigir que os Correios entregassem a ele todas as cartas endereçadas a esposa, de dispor livremente do seu salário – muitos receberiam os salários pelas esposas. Para tudo a mulher necessitava da autorização do pai ou do marido.
Segundo o “código napoleônico” a mulher adultera poderia ser condenada de três meses até dois anos de prisão. O adultero, pelo contrário, deveria pagar apenas uma pequena multa. Um dos seus redatores justificou tal disparidade: “A infidelidade da mulher supõe mais corrupção e tem o efeito mais perigoso que aquela do marido” e Engels, por sua vez, ridicularizou o artigo do código que decretava solenemente que “a criança concebida durante o casamento terá por pai sempre o marido” e concluiu irônico: “Eis aí o último resultado de três mil anos de monogamia.” 

Honte à vous, citoyens français! (Tradução: "Que vergonha, cidadãos franceses!"). Fim da aula.
Pois, mesmo não sendo feminista, Colette fez, pessoalmente, o que muitas feministas defendiam e as mulheres buscavam: ser livres para ser o que são e fazer o que querem.
É bem verdade que o roteiro de Wash Westmoreland, Richard Glatzer e Rebecca Lenkiewicz fixa-se mais nos anos iniciais da longa vida (81 anos) de Colette (a bela Keira Knightley): a adolescência no interior, a extrema cumplicidade com a mãe, Sido (Fiona Shaw), o casamento com Henry Gauthier-Villars, ou Willy (Dominic West), a ida para Paris, a vida de casada (difícil, porque Willy não era lá muito fiel...), o início da carreira literária com os romances da série "Claudine" (escritos por Colette e assinados por Willy), o meio artístico de Paris no início do século XX e... as primeiras relações de Colette com as mulheres – especialmente o caso amoroso com Mathilde de Morny, marquesa de Balbeuf (1863 - 1944), ou, simplesmente, "Missy"( Denise Gough).
Hummmm... pensando bem, a gentil (e sem noção) desembargadora não vai gostar não.
Bom, ela que se dane: nós adoraríamos muito que Colette estreasse logo no Brasil.
Por enquanto, fiquem com o trailer e fotos de still do filme.




Colette (Keira Knightley)

Colette (Keira Knightley) ao lado de Missy (Denise Gough, à esquerda)