16 julho, 2017

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LXII)

Ninguém sabe, mas sou uma pessoa rica. Não, não de dinheiro. Mas de amigos. Ter amigos é bem mais valioso do que ter conta nas Ilhas Cayman.
Uma destas amigas é Maria Caú, que escreveu um texto magnífico no Mulheres que Escrevem, do Mediumque eu faço questão de compartilhar com vocês que acompanham esta séria série.
Lá vai.

Quem tem medo de (se) dizer bissexual?

Minha longa jornada rumo à autoaceitação
Maria Caú
Formada em Cinema, doutoranda em Literatura Comparada, autora de "Olhar o mar: Woody Allen e Philip Roth - a exigência da morte", viciada em café e Netflix.
Jun 26

Entendeu? Ela não está indecisa.
(Foto de Bruno Poletti/Folhapress)

Aviso: esse é um artigo sobre “coming out”.
Começar este texto é, ao mesmo tempo, extremamente difícil e terrivelmente natural. Difícil porque preciso lidar mais uma vez com a possibilidade de me expor abertamente e as consequências imprevisíveis deste ato. Natural porque já comecei este texto muitas vezes, de diferentes formas, com muitos estilos e, ainda assim, ele jamais ganhou um ponto final e nunca deixou as pastas mais escondidas do meu laptop. Tenho, primeiro e mais uma vez, que lidar com um fato: talvez eu não tenha coragem de publicar o que estou escrevendo por impulso e por necessidade. Talvez. Se for assim, serei minha única leitora e tentarei ser bastante gentil comigo desta vez. É um processo lento e duro. Agora, se você está lendo isso, significa que tive coragem. Estou orgulhosa da minha coragem, se for este o caso. Mas sigo feliz de estar escrevendo, de qualquer maneira, ainda que estas linhas nunca sejam lidas por um Outro. “É preciso imaginar Sísifo feliz”, já disse Camus.
Vamos começar por onde sei começar, ainda que não seja o começo. [Se você se sentir confuso e atordoado lendo isso aqui, saiba que é justo esta a sensação que eu quis trazer à tona.] Dias atrás, P., antropóloga e minha amiga há 20 anos, deixou escapar durante um almoço: “Acho que você é a única pessoal bissexual assumida que eu conheço”, afirmação que primeiro me surpreendeu, depois me assustou. Pensei muito nessas duas palavras: bissexual/assumida.
Bissexual. Sim, eu sou bissexual. [Pausa para um suspiro porque escrever isso assim é um alívio tormentoso]. Acho que sempre foi assim. Tenho a vaga recordação de ter uns 12 anos e me autocensurar ao andar pela rua porque eu não deveria estar olhando para homens e mulheres com o mesmo nascente interesse. O mais louco é que, para mim, o grande problema então não era olhar para mulheres, mas olhar para ambos nesse ponto, a sociedade já tinha me vencido: eu já acreditava que não havia lugar para um olhar como o meu. Hoje, 22 anos depois, ainda me surpreendo com a capacidade dos meus olhos de se deterem em belezas muitas vezes tão contrastantes, e é engraçado perceber a facilidade com que a minha atenção se desvia, num carro de metrô, daquele cara barbudo de camisa social indo pro trabalho para aquela moça de dreads e camiseta dos Ramones. Demorei a aprender a conviver com essa elasticidade do olhar e demorei mais ainda para me orgulhar dela.

Coração com símbolo dos bissexuais

Vamos culpar o mundo em que eu cresci? Nasci em 1983 e morei até os 19 anos em Araruama, uma cidade que seria do interior, não fosse a praia e a proximidade com o Rio de Janeiro. No mundo em que me tornei adolescente, não existia essa coisa de bissexualidade. Mentira. Tinha o David Bowie, é verdade. Mas embora eu adore o David Bowie e o agradeça por trazer a palavra para o meu vocabulário, é meio difícil para uma adolescente que mora numa chácara se identificar com o David Bowie. “O cara é uma estrela do rock, eles não seguem as mesmas regras de todo mundo”, pensava eu, que continuava acreditando piamente que era preciso escolher.
Parecia uma escolha simples. Claramente, eu me sentia atraída por garotos desde cedo, então essa deveria ser uma negociação bem fácil comigo mesma. A atração que sentia por meninas, no entanto, me confundia, e por um bom tempo tive sucesso em não pensar mais profundamente no assunto. Até o dia em que fui visitar D., um dos meus melhores amigos da época, a pessoa com quem eu bebia tequila e fumava escondido, jogava RPG e amaldiçoava a existênciacoisas típicas dos 16, 17 anos. Me recordo perfeitamente a cena. Eu parada na sala dele, D. diz: Minha prima taí” e quase que instantaneamente desce as escadas uma moça ruiva, um ou dois anos mais velha do que eu, numa camiseta branca dos Rolling Stones. Nunca me esqueci daquela camiseta branca dos Rolling Stones. Foi um daqueles momentos em que você sente que os seus pensamentos estão aparecendo num balão de quadrinhos, em negrito, bem em cima da sua cabeça: “Tá todo mundo notando?”. O nome dela era Renata. Minha mãe se chama Renata, eu casei com um Renatoacho que o nome me persegue.
Nada mais aconteceu: sem clímax nessa trama, além do fato de a heroína ter tido imensas dificuldades para justificar seus sentimentos repentinos face à sua heterossexualidade proclamada. E assim vamos, meus amigos. Por anos. Anos. Eu digo sempre que a bissexualidade é um eterno sair do armário, mesmo que seja só para você mesma. Heterossexuais não precisam se assumir, gays se assumem um par de vezes. Bissexuais vão se assumir por uma vida inteira. E assim foi. 19 anos, prestes a entrar na faculdade, conheci um cara mais velho, me apaixonei, tive meu coração partido, tudo pela primeira vez, porque sou desses late bloomers da vida. (Pausa para um parêntesis deste escriba chato, para esclarecer a quem não domina o inglês o que é um late bloomer: "Pessoa que ainda não amadureceu; que ainda não desabrochou; que tem desenvolvimento tardio; que começou a amadurecer tarde". Fim do parêntesis. Vai, amiga.) Meses depois me encantei por uma colega de sala da UFF. Ela era uma hiponga de piercing de argola no nariz (não muito comum nos idos de 2002), que andava com cabelos emaranhados e um baseado sempre à mão. Ficamos amigas; passados uns meses, ela arrumou um namorado que tinha cabelos ainda mais emaranhados e fazia História ou Ciências Sociais, não lembro bem.
Enfim, vocês compreendem a cena. Não compreendem, talvez, a confusão interior que é o pano de fundo dessas experiências. Não entendem como é viver acreditando que o que você sente é uma mentira, algo que você inventou para si por algum motivo torpe, um cenário diabólico em que ora você aparece como uma menina hetero em busca de atenção e novas experiências descoladas (que pareciam tudo menos descoladas pelos conflitos que traziam), ora uma lésbica em permanente negação. E, às vezes, escolher entre essas duas máscaras parece menos assustador do que encarar a verdade: não há espaço para ser quem você é. Não aqui. “You can’t sit with us, you can’t sit with anyone.”
Levei décadas para me sentir confortável com dizer as palavras: “Eu sou bissexual”. De fato, essa definição é um tabu tão grande que, em geral, eu dizia qualquer outra coisa. “Acho que gosto dos dois”, falou um dia uma menina de 20 anos, vacilante, para uma das pessoas mais importantes da sua vida. Uma pessoa que reagiu mal, muito malo que talvez tenha me enfiado de volta no armário por mais uma temporada (ou duas, ou seis). Nessa mesma época, Gabrielly Rodin interrompeu seu show de drag queen para, do alto do seu salto doze e com seus olhos felinos, apontar um microfone para o meu rosto, enquanto uma câmera filmava minha reação de quase desmaio. “E aí, você gosta do quê? Você gosta de menino ou de menina?”. Ao ver que eu jamais conseguiria responder, ela se apressou em completar: “Pela sua carinha eu acho que você gosta dos dois”. Episódio que está catalogado nas minhas lembranças como: nunca duvidem do gaydar de Gabrielly Rodin.
O que a senhora Rodin soube com um olhar, no entanto, eu levei bastante tempo para descobrir ou encarar, que é uma forma de (re)descobrir. Na época da faculdade, tive algumas breves experiências com homens e mulheres, que nunca serviam para me convencer da validade da minha própria identidade. Contrariando a ideia de que bissexuais transam com qualquer um e o tempo todo, perdi a virgindade com 23 anos (e hoje me parece que minha confusão com relação ao sexo se ligava um pouco à minha incapacidade de me apaziguar com a minha orientação). Logo depois, engatei um namoro de dois anos com um homem que se esforçou para me convencer da minha heterossexualidade, por medo ou insegurança (sim, porque um bônus de ser bi é poder ter um parceiro que não aceite a sua orientação, coisa que não ocorre com heteros, gays e lésbicas). Em meio a esse namoro, desconstruí um mito: o de que homens hetero amam mulheres bis. A verdade é que eles podem até desejá-las com base em uma hipersexualização, ou na fantasia de um ménage, mas a maioria desses homens não quer ter uma mulher bissexual como parceira de vida e muitos temem serem "trocados por uma mulher" (porque afinal, o que pode existir de pior para um homem do que ser trocado por um ser socialmente inferior a ele?).
Foram anos e anos de muita confusão mental. De recorrer à opinião dos outros tentando esclarecer meus próprios sentimentos, de ler tudo que eu achava sobre o assunto, de entrar e sair periodicamente do meu armário mental, embora desde o fim do meu primeiro namoro eu já tivesse me assumido para a maioria das pessoas próximas. De fato, posso dizer que uma das últimas pessoas para quem eu me assumi fui eu mesma. A verdade é que me sinto confortável com ser bi há pouco tempo. Confortável com ouvir pessoas se referirem a mim assim, confortável ao falar sobre o assunto em mais detalhes, confortável ao responder essa pergunta. Eu, que tenho 34 anos, que fiz faculdade de Cinema, tenho um irmão gay assumido e sou de uma família não conservadora. É aí que eu penso naquela segunda palavrinha dita por P.: assumida. E me vem à cabeça uma pergunta-chave: Por que é tão difícil para um bissexual se assumir?

Rose Quartz, personagem bissexual da animação Steven Universe, criada pela também bissexual Rebecca Sugar.

Este não é um texto didático, mas pensei em fazer uma listinha das razões principais que tornam tudo tão difícil para nós, e talvez ajudar uma menina como a que eu era quando tinha 16 anosque já tem sobre mim duas vantagens: ela vive num mundo com alguma representatividade bissexual e provavelmente tem acesso livre e quase ilimitado à internet. Então, vamos aos pontos principais. É difícil se assumir bissexual porque:

1) A nossa orientação é invisibilizada. Dessa forma, acabamos achando que o que estamos sentindo não existe, é invenção da nossa cabeça, é uma ilusão. Acreditamos na monossexualidade, achamos que precisamos escolher. Isso fica latente em cada conversa, quando um “Eu sou bissexual” é sempre seguido de uma enxurrada de perguntas destinadas a comprovar que você é mesmo o que diz ser, como se ser bissexual fosse ser um agente da polícia secreta. “Você já namorou uma mulher?”; “Com quantas mulheres e quantos homens você transou?”; “Mas o que você prefere?”: são todas perguntas, francamente, hostis. Parem de fazer essas perguntas (em especial para pessoas que vocês não conhecem bem);

2) Mesmo na comunidade LGBT, nós sofremos discriminação. Pessoalmente, sempre me senti muito confortável na comunidade LGBT, sempre acreditei que aquela ali era a minha comunidade, mas foi ali também que muitas vezes sofri preconceito. Pergunte a uma mulher bi sobre a experiência dela com a bifobia crônica das lésbicas e ela lhe dirá. Homens bis sofrem ainda mais preconceito, de homens e mulheres (acredito sinceramente que esse é um dos principais motivos pelos quais há muito mais mulheres bis assumidas do que homens);

3) A sociedade construiu uma visão hipersexualizada dos bissexuais. Parece que as pessoas têm dificuldades imensas para entender o conceito, e preferem achar que a vida de uma pessoa bissexual é uma série infinita de orgias generalizadas e fora de controle (e seria um problema tão sério se assim fosse?). Eu tenho preguiça dessa visão porque… já mencionei que a minha primeira transa aconteceu quando eu tinha 23 anos?;

4) Não há representatividade suficiente. E representatividade importa e tem consequências. Grandes consequências.
Esse último ponto me leva à razão principal para escrever essas pouco coesas linhas. Colocando de maneira muito simples: estou escrevendo este texto porque precisava urgentemente dele. Uns 15 anos atrás. E ninguém o escreveu. E é por causa dessa enorme falta de representatividade que nós, bissexuais, ficamos nos escondendo em rótulos mais reconhecíveis, que causem menos confusão àqueles que convivem conosco e às custas, é claro, da nossa própria paz interior. Nos escondemos num discurso vazio que corre mais ou menos assim: “Está tudo bem, eu estou superbem com o fato de me interessar por homens e mulheres, só não quero falar sobre isso”. Queridx, senta aqui do meu lado, deixa eu te contar uma coisa: quando você chega no seu analista e diz “Tá tudooo bem, eu só não quero falar sobre isso”, é sinal de quê? De que não está tudo bem. Sabe quando está tudo bem? Quando não temos que nos esconder, quando não nos sentimos obrigados a viver em silêncio ou a conviver com desconfortáveis meias verdades.
Então, Maria, a que conclusão você chega? Não estava tudo bem para você, não é, moça? Mas acho que vai ficar, tem que ficar. Este texto nasce de um cansaço enorme, de uma vontade de viver sem medo e sem culpa. De uma necessidade de sinceridade, da vontade de abraçar longamente (logo eu, que nunca fui uma pessoa fisicamente afetuosa) aquela menina metaleira toda vestida de preto e cheia de atitude (mas tão perdida) que perambulava por Araruama em 1999. Um desejo de encontrar comigo mesma para um café amigável.
Meu nome é Maria Caú, tenho 34 anos. Demorou, mas acabei enjoando de brincar de esconde-esconde.

Pois é. Um dia, quando eu crescer, vou escrever um texto tão lindo e corajoso como esse.

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E agora a nossa indicação para esta séria série: The L Word.
Não, amigo leitor, você não leu errado. E não, não estou sugerindo que você reveja todos os episódios da série original, que foi ao ar no canal Showtime (no Brasil, pela Warner Channel) de 2004 a 2009... e sim, de uma continuação que virá por aí. E agora a nossa indicação para esta séria série: The L Word.
Não, amigo leitor, você não leu errado. E não, não estou sugerindo que você reveja todos os episódios da série original, que foi ao ar no canal Showtime (no Brasil, pela Warner Channel) de 2004 a 2009... e sim, de uma continuação que virá por aí.
Está aí o Estadão que não nos deixa mentir.

'The L Word' ganhará continuação 

REDAÇÃO - O ESTADO DE S.PAULO
11/07/2017, 16:57
Três atrizes da série original farão parte da sequência


A série 'The L Word' foi transmitida entre 2004 e 2009. Foto: Reprodução de cartaz 'The L Word'

The L Word, série que saiu do ar em 2009, ganhará uma continuação. Segundo o Deadline, o programa, transmitido pelo canal Showtime, terá três atrizes do elenco original: Jennifer Beals (Bette), Kate Moennig (Shane) e Leisha Hailey (Alice).
A ideia é que as personagens sejam uma ponte entre a trama anterior e a sequência. Outros atores que participaram da série, que foi exibida entre 2004 e 2009, podem apareceu durante a nova temporada. 
A história é sobre um grupo de lésbicas que vivem em Hollywood, seus amantes e suas famílias. Ilene Chaiken, criadora da série, será a produtora executiva da sequência. Ainda não há data de lançamento para a nova temporada de The L Word.

Se ainda não voltou, por que estou indicando?
Simples: para que as boas vibrações (minhas e suas) sejam enviadas a Ilene Chaiken, criadora e produtora executiva da série, para que vá adiante – sabe como é, de boas intenções o inferno dos projetos que não vão adiante está cheio.
Torçam muito para a volta de The L Word.

01 julho, 2017

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LXI)

Sim, é muito post desta séria série para um fim de mês só. Mas convenhamos, é muita mer... cadoria para comentar...
Mas antes, preciso de uma ajuda dos amigos leitores (se é que eles existem...) desta séria série.
Nestes últimos anos, foi um enorme prazer em comentar sobre assuntos referentes aos direitos LGBT e da mulher e, ao mesmo tempo, indicar filmes que Jair Besteiraro e sua catervada iriam a-do-rar (só que não...)
Bem, assunto nunca vai faltar. O que está faltando são filmes para indicar para eles (SIC), para os distribuidores (para ver se eles se coçam...) e para vocês – até porque priorizo filmes que nunca foram lançados no Brasil.
Daí, quem quiser que eu fale de um filme assim, com temática e/ou personagens LGBT fortes, pode escrever para este que vos fala – inclusive mandando informações e, se possível, os trailers.
Só não vale indicar (de novo) filmes que eu já falei aqui. No fim deste post tem uma lista de filmes e séries de televisão sobre o assunto, para que vocês não caiam na tentação de indica-los de novo.
Dito isso, voltemos à pobre vaca, que já está congelando, coitada...

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Já que supunhetamos no assunto (copyright Aldir Blanc, de novo) igrejas evangelicuzinhas versus estado laico, que já comentei em post anterior desta séria série, sobre Marcelo Crivella versus carnaval...
O Globo de domingo, 11 de junho de 2017, publicou matéria sobre os "tratamentos" de "cura gay" (assim mesmo, sr. revisor, os dois entre aspas, obrigado). Na matéria, o óbvio ululante aqui em Terra Papagalli: apesar da Organização Mundial da Saúde (OMS) retirar a homossexualidade da lista internacional de doenças em 1992; apesar de todas as associações médicas, de psiquiatria e de psicologia do mundo inteiro, e do Brasil, em particular (especialmente o Conselho Federal de Psicologia, que há quase duas décadas no país baixou uma norma, proibindo terapias que prometem a conversão ou reversão da orientação sexual) – apesar de tudo isso, continua a ser praticada por "psicólogos" (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas de novo, obrigado) que ainda acham que a homossexualidade é uma patologia. Pior: dois ilustres dePUTAdos da bancada evangelicuzinha apresentaram projetos de lei para permitir tais terapias inúteis, que aguardam relatores para análise e votação.
Um dos projetos é do dePUTAdo Pastor Eurico (PSB-PE), pedindo a suspensão da norma do CFP e sugerindo uma "pesquisa científica sobre o comportamento das pessoas homossexuais".
O outro é do dePUTAdo pastor Ezequiel Teixeira (PTN-RJ) – sim, aquele mesmo quejá foi personagem nesta séria série, quando foi exonerado pelo governador Luiz Fernando Pezão do cargo de secretário do Direitos Humanos do estado do Rio de Janeiro – onde tentou acabar com o programa Rio Sem Homofobia (dizendo que era só para cortar custos e reorganizar o programa), mas acabou se traindo em sua tacanhice, ao afirmar ao repórter do jornal O Globo que era a favor da "cura gay"... o que se confirma em seu projeto de lei, que fala em "direito à modificação da orientação sexual em atenção à dignidade humana". É o caso de se perguntar: a quem incomoda tanto a homossexualidade dos outros que tem gente querendo curá-la? E por quê? A homossexualidade faz mal ao homossexual EM QUÊ?
E também é o caso de informar aos defensores de uma "cura" para o que não é doença: terapias para "curar" a homossexualidade são iguais a tratamentos para transformar a cor dos glóbulos sanguíneos – ou seja, são inúteis e não servem para porra nenhuma. CQD um certo acadêmico de medicina, chamado Noel Rosa...


Coração (Samba Anatômico) (Noel Rosa)
Noel Rosa e orquestra - 1932

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E sim, já que esta séria série é sobre Jair Besteiraro, deveria ter falado alguma coisa sobre a tristemente célebre palestra (SIC) proferida (ou seria cagada?) por ele no clube Hebraica (Rio de Janeiro), em 3 de abril deste ano. Mas não tive tempo e nem estômago para isso: o sal de frutas que tinha em casa não foi suficiente para comentar as suas "opiniões" (SIC, de novo) racistas. (Isso num clube que reúne a comunidade judaica carioca – ela mesma, escravizada pelos egípcios e tida como "inferior" por vários antissemitas, como por exemplo... Quem mesmo? Ah, sim, um tal de Hitler...)
Ainda assim, tenho de comentar uma das m... que Besteiraro comentou em sua palestra:

"Eu tenho 5 filhos. Foram 4 homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher."

Vamos ver se entendemos. Ao falar de seus cinco filhos, Besteiraro se orgulha de seus quatro filhos homens, mas trata a sua única filha como "uma fraquejada". É isso mesmo, produção?
Fica uma pergunta (em maiúsculas): O QUE DIABOS JAIR BESTEIRARO TEM CONTRA AS MULHERES? Sim, porque não é a primeira escrotidão que sai de sua bocatrina (= boca + latrina – neologismo criado por aquele amigo meu, que é a franqueza em pessoa...) contra as mulheres em geral, e as feministas, em particular.
Quem puder me esclarecer isso, comente neste texto.
Porque, por enquanto, balanço entre duas teorias.
Teoria 1: misoginia causada por machismo exacerbado.
Teoria 2: misoginia como consequência da homofobia, causada por impulsos homossexuais reprimidos. Aliás, eu já falei disto nesta séria série, com direito a um vídeo falando sobre uma experiência numa universidade americana, com direito a esta trecho de um documentário sobre o assunto.


Trecho do documentário Middle Sexes Redefining He and She, exibido pela HBO.

Aliás, este mesmo assunto – homossexualidade reprimida e gays enrustidos – foi citado em artigo de Mariliz Pereira Jorge na Folha de S. Paulo de 13 de maio de 2017 a respeito de outro assunto: homofobia no futebol. Sem comentários: o artigo (e os grifos, que são meus) fala por si.

O Departamento de Psicologia da Universidade da Georgia (EUA) conclui o que muita gente desconfia: homofóbicos são gays enrustidos. Na maioria dos casos, há um conflito tão grande quanto à própria sexualidade que o tormento se transforma em raiva e agressividade.
Os pesquisadores recrutaram homens, declaradamente heterossexuais. Eles enfrentaram uma bateria de perguntas que os dividiu em dois grupos: os que se sentiam mais e o que se sentiam menos desconfortáveis com o assunto homossexualidade.
Em seguida todos foram equipados com um pletismógrafo peniano, aparelho que mede o grau de excitação do pênis em resposta a imagens. Os participantes assistiram a cenas de sexo heterossexual, entre duas mulheres e depois entre dois homens.
O surpreendente das reações nessa última situação é que cobaias do grupo com mais tendências homofóbicas tiveram quatro vezes mais aumento de volume peniano do que os do grupo formado por quem não se incomodava com homossexuais. Mais da metade dos "homofóbicos" teve ereção, enquanto menos de um quarto do outro grupo mostrou algum tipo de excitação ao ver as imagens de dois homens transando. Bastante revelador: depois do teste, quando confrontados, todos os homofóbicos negaram o que sentiram minutos antes.
O estudo tem 20 anos. De lá para cá, outras instituições realizaram testes parecidos e o resultado é sempre o mesmo: a atitude negativa, a agressividade, a intolerância e a fobia se manifestam em pessoas que tentam reprimir o desejo sexual que sentem por outros do mesmo gênero.
Essas pesquisas não raramente citam casos de pessoas públicas, homofóbicos engajados, flagrados em relações homossexuais. Podem também ser uma boa explicação para tanto preconceito em ambientes predominantemente masculinos e homofóbicos, como o do futebol.
A sexualidade de um jogador voltou a ser tema de polêmica com a volta de Richarlyson ao futebol brasileiro, depois de uma temporada na Índia e de uma participação no "Dancing Brasil", na TV Record. Toda a história remete à Idade da Pedra.
O Guarani tentou fazer toda a negociação sem que a imprensa e os torcedores soubessem porque dirigentes temiam rejeição. Depois começou a polêmica nas redes sociais. O clima era mais ou menos assim: "O problema de ter o Richarlyson em campo é que sempre o Guarani vai jogar com um homem a menos." "Está certo o Richarlyson, em Campinas só tem veadão, voltou pro seu habitat."
Segunda, dia da apresentação do jogador, o Brinco de Ouro da Princesa, estádio do Guarani, foi alvo de duas bombas atiradas por torcedores. Tanto o clube quanto Richarlyson falam da polêmica em torno de sua contratação sem apontar o real motivo: homofobia.
Richarlyson jamais se declarou gay. Mesmo que seja, parece imprudente sair do armário diante do nível de intolerância que podemos observar. O futebol tem quase 30 mil jogadores profissionais. Alguém acredita que nesse universo não haja homossexuais?
Imagine, então, entre os milhões de torcedores, principalmente entre esses que acham que "bicha" é xingamento, que futebol é coisa de "homem", expulsam e ameaçam membros da torcida descobertos em relações gays, explodem bombas e fazem piadinhas imbecis na internet. Segundo os estudos: tudo gay enrustido.

Resumindo: de acordo com a boa ciência, homofóbicos raivosos são gays enrustidos. E misóginos igualmente raivosos? Serão também? Com a palavra, a ciência.

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O amigo leitor sabe o que é fanfic?

Fanfiction, fanfic, ficção de fã ou ainda ficfã é uma narrativa ficcional, escrita e divulgada por fãs em blogs, sites e em outras plataformas pertencentes ao ciberespaço, que parte da apropriação de personagens e enredos provenientes de produtos midiáticos como filmes, séries, quadrinhos, videogames, etc, sem que haja a intenção de ferir direitos autorais ou obter de lucros. Portanto, tem como finalidade a construção de um universo paralelo ao original e também a ampliação do contato dos fãs com as obras que apreciam para limites mais extensos. 

Pois é. E o Segundo Caderno d' O Globo de domingo, 25 de junho de 2017, trouxe em sua capa uma matéria sobre as mais diversas fanfics em torno da série de livros do bruxinho Harry Potter.
E como variam estas fanfics.
Algumas tem a ver com esta séria série.
Tipo assim, um romance entre Harry Potter e Rony Weasley – aquele menino meio ingênuo que, na verdade (e no final) fica com Hermione.
Ah, sim, e um monte de fanfics com a própria Hermione: a menina inteligente e determinada, parceira de aventuras de Harry e Rony, já se apaixonou pelo vilão Draco Malloy (!); já transou com o professor Severo Snape num banheiro de Hogwarts (!!); já foi sequestrada pelo grande vilão Voldemort e abusada numa masmorra (!!!) (sim, tem neguinho que é bolsonariamente sádico com as meninas...)... e até uma (que também tem a ver com esta séria série) em que Hermione é lésbica e tem um romance com Luna Lovegood (!!!!!!!!!).
Conclusão: caros autores de fanfics, vão ter imaginação fértil assim lá em Hogwarts!...

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Antes da indicação de novo filme para esta séria série, preciso falar de um aniversário.
Neste ano da graça de 2017, o filme Mädchen in uniform (Senhoritas em uniforme), de Leontine Sagan – o primeiro filme alemão que aborda com grande simpatia os amores de meninas que amam meninas - completa 86 anos.
Há uma sequência do filme disponível no YouTube.


Beijo entre Frau von Bernburg (Dorothea Wieck) e Manuela (Hertha Thiele), 
em Mädchen in uniform (1931)

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E finalmente, a minha óbvia e ululante indicação para esta séria série: Divinas divas (2017), documentário de Leandra Leal que conta a trajetória de oito artistas que pertencem à primeira geração de travestis do Brasil, que fizeram história no Rival (justamente o teatro que pertence à família Leal há gerações): Rogéria, Jane Di Castro, Divina Valéria, Eloína dos Leopardos, Brigitte de Búzios, Camille K., Fujika de Halliday e Marquesa (que morreu em 2015 aos 71 anos, tão logo terminaram as filmagens) – igualmente testemunhas do auge da Cinelândia repleta de cinemas e teatros.
O filme está em cartaz, e o trailer está aqui.

Trailer oficial de Divinas divas.

De lambuja, uma entrevista de Leandra Leal a Jessica Tauane, para o Canal das Bee.

DIVINAS DIVAS - Com Leandra Leal
(Canal das Bee – YouTube)

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Agora sim, está valendo a ajuda que solicitei a vocês, amigos leitores desta séria série, para indicações de filmes que Jair Besteiraro e sua catervada vão a-do-rar... só que não...
E mais uma vez: não vale indicar de novo os filmes que já foram citados aqui nesta séria série, cuja lista vai abaixo:

1- The Four-Faced Liar (EUA, 2010), de Jacob Chase, a partir de peça teatral de Marja Lewis-Ryan.
2- Minha adorável lavanderia (My beautiful laundrette, 1985), de Stephen Frears.
3- Pacote família (Family Pack, aka Que faisaient les femmes pendant que l'homme marchait sur la lune?) (Bélgica / Canadá / França, 2000), de Chris Vander Stappen
4- Friends and Family (EUA, 2000), de Kristen Coury
5- Como esquecer (2010), de Malu di Martino.
6- O Diário Roubado (Le Cahier Volé - França, 1993), de Christine Lipinska.
7- Filme: Parágrafo 175 (Paragraph 175, EUA, 2000), documentário de Rob Epstein e Jeffrey Friedman.
8-  Saia justa (Straight-Jacket, EUA, 2004) de Richard Day.
9- A gaiola das loucas (La cage aux folles - França-Itália, 1978), dirigido por Edouard Molinaro.
10- Vera, (Brasil, 1986) de Sérgio Toledo.
11- Filme: Plata quemada (Argentina-Uruguai, 2000) de Marcelo Piñeyro.
12- Yossi & Jagger (Israel, 2002), de Eytan Fox
13- Vinhetas do 18º Festival Mix Brasil, de 2010
14- (XIV) – Filme: Habitación en Roma (2010), de Julio Medem
15- But I'm a cheerleader (1999) – aka Nunca fui santa (Portugal), aka Escolinha do babado (8º Mix Brasil) - de Jamie Babbitt.
16- Meninos não choram (Boys don't cry - EUA, 1999), de Kimberly Peirce
17- Escape to Life: The Erika and Klaus Mann Story (Alemanha, 2000), de Wieland Speck e Andrea Weiss.
18- Assunto de meninas (Lost and delirious - Canadá, 2002), de Léa Pool.
19- Amor em tempos de guerra (Un amour à Taire – França, 2005), de Christian Fauré
20- As filhas da Chiquita (Brasil, 2006), de Priscila Brasil
21- Borboleta (Hu die - Hong Kong, 2004), de Yan Yan Mak.
22- Duas mulheres (Portugal/Brasil, 2009), de João Mário Grilo.
23- Hineini: Coming Out in a Jewish High School (EUA, 2005), documentário de Irena Fayngold.
24- The politics of fur (EUA, 2002), de Laura Nix, exibido no 10º Mix Brasil (2002) com o título de O poder da sedução.
25- Un mondo d'amore (Itália, 2002), de Aurelio Grimaldi
26- Daughters of Club Bilitis (2011), telefilme de Han Joon-Seo, exibido na KBS, rede de rádio e TV sul-coreana.
27- Zerofilia (Zerophilia - EUA, 2005), de Martin Curland.
28- I Can't think straight (Reino Unido, 2008), de Shamin Sarif.
29- The World Unseen (Reino Unido, 2007), aka O Mundo Invisível, de Shamin Sarif.
30- Tipping The Velvet (Reino Unido, 2002), dirigida por Geoffrey Sax – série em 3 episódios para a BBC , baseada no romance homônimo de Sarah Waters (coautora do roteiro, junto com Andrew Davies).
31- Imagine Eu & Você (Imagine Me & You – Reino Unido, 2005), de Ol (Oliver) Parker – na verdade, mais conhecido pelos ilustres cinéfilos brasileiros por ser marido de Thandie Newton (de Assédio, 1998, de Bernardo Bertolucci), com Piper Perabo (Assunto de meninas) no elenco.
32- Lip service (Reino Unido, 2005) - série criada por Harriet Braun para a BBC.
33- Puccini for beginners (Puccini para iniciantes ou Os 3 lados do amor – EUA, 2006), de Maria Maggenti.
34- Sociedade dos Poetas Mortos (EUA, 1989), de Peter Weir
35- Cracks (batizado - com muita imaginação... – como Sedução – EUA, 2009), de Jordan Scott
36- The Dreamers (Os sonhadores – França/Itália/Reino Unido, 2003), de Bernardo Bertolucci.
37- Anatomy of a Love Seen (EUA, 2014), de Marina Rice Bader.
38- Versos de um crime (Kill your darlings - EUA, 2013), de John Krokidas.
39- Sangailė ou The Summer Of Sangaile (Fralita Films / Lituânia - Les Films d'Antoine/França - Viking Film / Países Baixos), de Alanté Kavaïté + Canal das Bee.
40- O animal sonhado (Brasil 2015), realização coletiva.
41- The Watermelon woman (EUA, 1996), de Cheryl Dunne.
42- Pride (em português, Orgulho e Esperança – Reino Unido, 2014), de Matthew Warchus.
43- Jenny's wedding, de Mary Agnes Donoghue (EUA, 2015), com Katherine Heigl (Gray's anatomy) e Alexis Bledel (Gilmore girls)
44- curtas do programa Não amarás, do 26º Curta Kinoforum - Festival Internacional de Curtas de São Paulo: Office du Tourisme (Posto de Turismo - França, 2014), de Benjamin Biolay; San Cristóbal (Chile, 2015), de Omar Zúñiga Hidalgo; Libre Maintenant (Agora Livre - Bélgica, 2014), de Pierre Liebaert ; Copyleft (Brasil-MG, 2015), de Rodrigo Carneiro; e A vida do fósforo não é bolinho, gatinho (Brasil-SP, 2014), de Sergio Silva.
45- Vestidas de noiva (Brasil, 2015), das diretoras (e noivas) Gabi Torrezani e Fábia Fuzeti.
46- Ghosted (Alemanha/Taiwan, 2009), de Monika Treut.
47- The Girl King (A Jovem Rainha – Suécia/Finlândia/Canadá/Alemanha, 2015), de Mika Kaurismaki.
48- Parceiras Eternas (Life partners - EUA, 2015), de Susanna Fogel.
49- All about E (Austrália, 2015), de Louise Wadley.
50- Liz en Septiembre (Liz in September), de Fina Torres (Venezuela, 2014).
51- Almost adults (EUA, 2015), de Sarah Rotella, com Elise Bauman e Natasha Negovanlis, da web série Carmilla.
52- Raven's Touch (2015), de Marina Rice Bader e Dreya Weber.
53- Freeheld (Amor por direito – EUA, 2015), de Peter Sollett, com Julianne Moore e Ellen Page.
54- Transit girls, (Japão, 2015) minissérie da Fuji TV japonesa.
55- About Ray (Meu nome é Ray - EUA, 2015), de Gaby Delial.
56- Three Veils (EUA, 2011), de Rolla Selbak, com Shetal Sheth (atriz de The World Unseen e I Can't Think Straight, de Shamin Sarif) no elenco.
57- Curva (Gypo – Reino Unido, 2005), de Jan Dunn (13º Mix Brasil, 2005).
58- Não se preocupe, é só uma fase (Du ska nog se att det går över / Don't You Worry, It Will Probably Pass - Suécia, 2002), de Cecilia Neant-Falk (11º Mix Brasil, 2002).
59- A criada (Ah-ga-ssi / The Handmaiden - Coreia do Sul, 2016), de Park Chan-Wook– livremente inspirado no romance Fingersmith, de Sarah Waters (edição brasileira: Na ponta dos dedos – Rio de Janeiro, Record, 2005) transferida da Londres vitoriana do século XIX para a Coreia sob ocupação japonesa, nos anos 1930
60- e Mango kiss (EUA, 2003), de Sascha Rice (13º Mix Brasil, 2005).
61- Tão de repente (Tan de repente - Argentina, 2002), de Diego Lerman (11º Mix Brasil, 2002).
62- Filme: Ronda noturna (Ronda nocturna - Argentina, 2005), de Eduardo Cozarinsky (13º Mix Brasil, 2005).
63- Anarchy Girls (Anarchija Zirmunuose – Lituânia, 2010).

Bom fim de semana, e boas indicações. E desde já, obrigado.