05 setembro, 2011

BURUNGA OU BURUDUNGA? (ou: SOBRE A ELEIÇÃO DA ABD NACIONAL)

O gentil leitor não conhece a piada? Então vamos lá.
Numa selva qualquer (africana ou amazônica, fica à escolha do contador da piada), uma expedição multinacional é capturada por uma tribo feroz, e seus membros são levados diante de seu chefe, que oferece a cada um deles duas opções: burunga ou burudunga.
Burunga é simples: o cidadão é decapitado e assado para alimentar a tribo.
burudunga é simples: o cidadão tem a sua vida poupada depois de... como explicarei para não chocar os gentis leitores? Bem, procurem no dicionário o significado do termo sodomia. Para efeitos da piada, usaremos o vulgar termo créu.
Faziam parte da expedição um francês, um inglês e um americano.
O francês não tem dúvidas: escolhe burudunga. O chefe da tribo pega o francês e créu.
A escolha do inglês é a mesma: burudunga. O chefe da tribo pega o inglês e créu.
Quando chega a vez do americano, a coisa muda de figura. O ianque deita a maior bronca no chefe e em seus companheiros de expedição:
- Oxente, mas que cambada de xibungos mais frouxa! Comigo não, que sou macho retado desde que nasci e não vou me prestar a isso! Prefiro é morrer mas morrer macho! Burunga, seu filho-de-uma-que ronca-e-fuça!
O chefe da tribo olha para o americano, pensa um pouco (que diabos será "filho-de-uma-que ronca-e-fuça"? Elogio ou xingamento?), mas decide, sério:
- Então é burunga? Vamos de burunga.
Depois esfrega as mãos, com um riso sacana:
- Mas antes uma burudungazinha!...
Ato contínuo, pega o americano e créu...
Moral da história: não se pode ficar contemporizando o tempo todo com o poder; fazendo ou não acordos com ele, acaba sempre tomando no forévis...
Guardadas as devidas proporções, esta piada, mais velha que andar para a frente, resume bem o que foi a gestão 2009-2011 da ABD Nacional – aquela entidade que reunia os realizadores de documentários e curtametragens de Terra Papagalli, lembram-se?
Já o final da piada sintetiza bem o agitado processo eleitoral para a escolha de sua nova diretoria.
Resumo da ópera: pela primeira vez, duas chapas concorreram à Diretoria da ABD Nacional. Uma chapa, ABD VIVA, era a chapa, digamos, da situação, encabeçada por Cynthia Falcão, diretora secretária da atual gestão. A outra chapa, ABD ATIVA, tinha como candidato a presidente Orlando Bonfim, documentarista veterano.
Disputa sadia? Nem tanto. Terminou antes de começar, dada a descoberta de certas irregularidades na chapa da situação, ABD VIVA, que tinha dois pequenos (SIC) problemas:
1º - O Capítulo VIII do Estatuto da ABD – que trata das Eleições – em seu Artigo 29, Parágrafo 2º, reza o seguinte: “Cada chapa deverá ter no máximo duas pessoas de um mesmo estado e no mínimo uma pessoa por região geográfica.” Problema da chapa ABD VIVA: não tinha integrantes das ABDs da Região Sul (RS, SC e PR)
2º - Ao se candidatar, Cynthia Falcão apresentou-se como "documentarista, realizadora, militante, educadora, representante dos trabalhadores do audiovisual, mãe e mulher."
Só esqueceu de dizer: e funcionária pública. Cynthia Falcão é Chefe de Divisão de Formação do Centro Audiovisual Norte Nordeste (Canne) da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, órgão equivalente ao Centro Técnico Audiovisual (CTAv), no Rio de Janeiro, que presta os mesmos serviços técnicos para realizadores do Norte e Nordeste.
Uma consulta foi feita à Comissão de Ética do MinC, e o relatório foi claro em sua conclusão:


"O Código de Ética do Ministério da Cultura prevê no inciso XXV do art. 9º e inciso II do art. 11 vedações que se identificadas ocorrências caracterizam infração ética. Segue:
Art. 9º É vedado ao agente público:
(...)
XXV - utilizar-se de informações privilegiadas, de que tenha conhecimento em decorrência do cargo, função ou emprego que exerça, para influenciar decisões que possam vir a favorecer interesses próprios ou de terceiros;
Art. 11. Ficam vedados atos, cujo propósito possa ser substancialmente afetado por informação da qual o agente público tenha conhecimento privilegiado, para fim especulativo ou favorecimento para si ou para outrem, assim como:
(...)
II - o exercício no Ministério da Cultura de servidores que forem sócios, responsáveis ou acionistas de qualquer categoria, ou que prestam serviços a empresas ou estabelecimentos que se relacionem, de qualquer forma, com o Ministério da Cultura;
(...)
14. Diante do exposto a Comissão de Ética do Ministério da Cultura conclui que existe impedimento do exercício em paralelo das funções de Chefe de Divisão de Difusão e Formação da Fundação Joaquim Nabuco, vinculada ao Ministério da Educação com a de Presidente da Associação Brasileira de Documentaristas e Curta Metragistas por conflitar matérias de áreas afins.


Por que existe impedimento? Simples: nesta função estratégica, é fácil articular com as ABDs do Norte e Nordeste apoios firmes (leia-se votos de cabresto) para a chapa ABD VIVA.
A seguir, o relato de Orlando Bonfim:


Prezados Abedistas,
Desde o início de nossas manifestações realçamos o princípio básico de buscar uma coesão que proporcionasse a formação de uma chapa de consenso.
Por obrigação de direito, alertamos a candidata da outra chapa da impossibilidade da sua candidatura, em função de ser funcionária pública, Chefe de uma Divisão do CANNE, que é diretamente ligado à SAV - Secretaria do Audiovisual /MINC -Ministério da Cultura.
Lamentavelmente, nossos apelos não foram levados a sério, ao contrário.
Não pretendíamos chegar a ter a necessidade de mostrar a documentação da Comissão de Ética do Ministério da Cultura que é enfática com relação ao assunto.
Tentei, no tumultuado encontro em Triunfo (PE) mostrar o documento. Não houve nenhum interesse, mas ouvi em sussurro a seguinte frase: "publica na lista", com tom de deboche.
Sendo assim, tornou-se imperioso a sua exibição pública para que todos possam tomar ciência e verificar que eram reais nossos alertas quanto à ética e legalidade do processo.


A Comissão Eleitoral, obedecendo às regras vigentes, e à luz dos documentos apresentados, impugnou a chapa ABD VIVA, de d. Cynthia Falcão.
Assim, apenas uma chapa – ABD ATIVA – concorreu ao pleito.
Assunto encerrado?
Infelizmente, não:


INFORME ELEIÇÃO DA ABD NACIONAL
Em assembléia realizada hoje, dia 28 de agosto de 2011, em São Paulo, a única chapa habilitada pela Comissão Eleitoral para concorrer não obteve maioria simples de votos dos eleitores presentes ao pleito (26 ABDs habilitadas para voto), motivo pelo qual não foi proclamada eleita. Diante do novo cenário e do poder soberano da assembléia foi prorrogado o mandato da atual Diretoria da ABD Nacional, pelo período máximo de 6 meses a partir desta data, com objetivos específicos:
- Administrar o expediente das entidades;
- Representá-la institucionalmente e,
- Realizar a assembléia geral para realizações das eleições até 28 de fevereiro de 2012.
São Paulo, 28 de agosto de 2011.


Em português claro: não podendo eleger Cynthia Falcão, pega com a boca na botija em irregularidades, o grupo que articulou sua candidatura resolveu dar sua burudungazinha...
Claro, o pau está comendo. Várias ABDs regionais, diante deste golpe de joão-sem-braço, pensam seriamente em deixar a ABD Nacional – se os golpistas querem ficar com ela, bom proveito.
E eis que d. Solange Lima, presidente da ABD Nacional, tenta explicar o inexplicável. A seguir, alguns trechos de sua (não) explicação (os grifos são nossos):
"(...) esta decisão foi corajosa e sim marcará uma época, uma maioria decidiu rejeitar uma forma arcaica de fazer política, e apostando numa nova forma foi solidária com os parceiros que foram expostos de forma pequena neste processo eleitoral. Pois isso sim é uma ameaça à legitimidade da entidade mais antiga, cuja função sempre foi proteger das perseguições e não perseguir.
Posso lhe garantir que a eleição foi legítima, que das 26 ABDs presentes 16 votaram NÃO e 10 votaram SIM. Logo foi a maioria que decidiu por NÃO eleger a única chapa concorrente. Portanto, sim, esta assembléia é legitima e é soberana.”


Emenda pior do que o soneto. Vamos reler dois trechos grifados:


"(...) uma maioria decidiu rejeitar uma forma arcaica de fazer política, e apostando numa nova forma foi solidária com os parceiros que foram expostos de forma pequena neste processo eleitoral."


Peraí... A denúncia de uma irregularidade GRAVE na chapa ABD VIVA – a tentativa de aparelhamento - passou a ser “uma forma arcaica de fazer política”?
E o que seria essa “nova forma” de fazer política? A ressurreição do velho coronelismo dentro da ABD Nacional, com o uso da máquina do serviço público (o Centro Audiovisual Norte Nordeste - Canne) para aparelhamento político, angariando votos de cabresto entre as diretorias das ABDs do Norte e Nordeste? Essa sim, não seria "uma forma pequena"?
Não se sabe quais foram as 16 ABDs que votaram contra a chapa de Orlando Bonfim.
Mas vocês querem apostar que, entre elas, estão as ABDs do Norte e Nordeste, cujos associados, por curiosa coincidência, são os clientes preferenciais dos cursos e equipamentos do Canne, cuja Chefe de Divisão de Formação se chama Cynthia Falcão?
O mais engraçado desta explicação furada foi este trecho:


"Pois isso sim é uma ameaça à legitimidade da entidade mais antiga, cuja função sempre foi proteger das perseguições e não perseguir."


Proteger das perseguições?
Uma historinha para ilustrar esta “proteção”.
Em 2009, o secretário da ABDeC-RJ enviou mensagem para todas as listas de discussão, questionando um projeto de uma empresa privada, um concurso de roteiros para curtas e médias metragens. Mais especificamente, o seu orçamento (R$ 430.000,00) e sua diferença entre a quantia destinada a premiação (o melhor roteiro de curta ganharia R$ 40.000,00 + o melhor roteiro de média metragem, R$ 70.000,00 = total de R$ 110.000,00 em prêmios) e a quantia para as despesas operacionais (nunca especificadas direito) – R$ 320.000,00.
A idéia dele era fazer surgir uma discussão sobre tal projeto. E, de quebra, alertar a presidente da ABD Nacional, Solange Lima, da possível roubada em que estava entrando. Motivo: sem consultar ou mesmo avisar ninguém da diretoria da ABD Nacional, d. Solange aceitou fazer parte do júri deste concurso questionado.
(Detalhe: em nenhum momento o então secretário ofendeu alguém, nem d. Solange, nem o empresário.)
Não foi o que aconteceu. Para começar, o empresário idealizador deste concurso, ao invés de se explicar direito, AMEAÇOU PROCESSAR O SECRETÁRIO POR CALÚNIA E DIFAMAÇÃO.
Epa, isso é perseguição – mais especificamente, um golpe do tal empresário para não dar as explicações devidas. E se a função da ABD Nacional “sempre foi proteger das perseguições e não perseguir”, iria reagir em defesa de um associado da ABDeC-RJ, o secretário, desta ameaça de perseguição, certo?
Errado. Ao invés disso, d. Solange Lima, presidente da ABD Nacional, entrou para a história da entidade como a primeira dirigente a AMEAÇAR UM ASSOCIADO DE UMA ABD REGIONAL (ele mesmo, o secretário da ABDeC-RJ) DE PROCESSO – POR CALÚNIA E DIFAMAÇÃO.
E a ABDeC-RJ, como reagiu? Assim: o secretário foi pressionado até o limite pelo então vice-presidente da entidade – de olho num cargo na próxima diretoria da ABD Nacional, e por sua vez pressionado por d. Solange – para que SE RETRATASSE ou SE DESCULPASSE com d. Solange Lima (DE QUÊ? Isso até hoje não entendemos); quanto ao empresário (frase textual), “a história dele com [o tal empresário] infelizmente ele terá que resolver por conta própria”.
O secretário não se retratou – retratar-se DE QUÊ? – e preferiu renunciar. Atualmente, quer distância da ABDeC-RJ ou da ABD Nacional.
A crise na ABD Nacional está aí. E é grave. E esta disputa pelo poder não ajuda em nada a agregação de documentaristas e curtametragistas em torno dela. Afinal, ninguém quer se expor a uma burunga ou a uma burudunga, dentro deste modo de "proteger das perseguições e não perseguir"...

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