Diário do Bolso
– 14
Querido diário,
com a imprensa eu não falo. Não falo, não falo, não falo! Mas para ti eu me
abro feito uma rosa desabrochada. Opa! Digo, feito uma metralhadora desmontada.
Ah, como estar
no avião voltando para casa. Odiei cada minuto naquela terra (que ainda não sei
se chama Dávos, Davós, ou Davôs). O frio era de lascar. O xixi virava gelo
antes de bater na naftalina. Tá, é exagero, mas por pouco.
O pior não era
mijar. Era falar em público. Pô, como isso é difícil. O meu negócio é falar
para a câmera do celular, falar lá em casa para o facebook. Com um monte de
jornalista e político olhando não dá.
Aquele discurso
de abertura parecia que não acabava mais. Me disseram que teve menos de sete
minutos, mas para mim durou mais que uma partida de futebol. E daquelas que seu
time leva goleada. Que inferno! Mas eu acho que fiz uma boa retrospectiva do
nosso futuro. Ou será que o certo é dizer que eu fiz uma boa previsão do nosso
passado? Tanto faz. De qualquer jeito a imprensa esquerdocomunista ia dar um
jeito de me criticar.
Por isso que eu
não falei lá na coletiva. Acho que foi a primeira coletiva com ausência
coletiva da história. Eu até cheguei cedo e sentei lá com o Moro, o Araújo e o
Guedes. Mas quando eu percebi que o pessoal ia começar a entrar, me meti
debaixo da mesa e chamei os três. Eles acharam ótimo não ter que falar.
O Moro não quer
nem ver a imprensa, porque iam perguntar: “O senhor não diz que persegue os
corruptos? O que acha do caso Queiroz? Não vai ter coercitiva?”
O Guedes não
quer que perguntem do plano econômico dele, porque o plano dele é só “Vamos
privatizar tudo que der”. E isso aí é mais curto que o meu discurso.
E o Araújo não
quer falar porque acha que todo mundo aqui é maluco: “Como é que podem falar em
aquecimento global se no encontro global faz um frio desses?”
Bom, aí nós
quatro ficamos ali embaixo da mesa, esperando os jornalistas irem embora. Pra
gente se distrair, ficamos jogando jokempô. Eu ganhei todas as partidas, porque
pros outros só valia pedra, papel e tesoura, mas pra mim valia revolvinho. O
Moro até começou a reclamar, mas aí eu disse: “Eu sou o presidente, pô. Eu que
mando na lei”. E aí ele ficou calado.
Aliás, foi ótimo
o Mourão ter assinado aquela mudança na Lei de Acesso à informação. E o BC já
está encaminhando aquela coisa de parar de investigar parente de político. É
que nem eu sempre digo: “Tem que mudar isso daí!”.
Mas o melhor de
tudo, Diário, é que, enquanto eu volto, o Jean Wyllys vai embora. O Brasil está
ficando cada dia melhor.
Ah, e fica
tranquilo: eu vou te levar para o hospital comigo. Com a imprensa eu não falo,
mas pra você eu conto tudo.
*********
Digam o que
disserem de Ricardo Boechat – que morreu ontem, 11 de fevereiro de 2019, num
acidente de helicóptero, em São Paulo. Há quem gostasse do que ele dizia. Há
quem não gostasse.
Talvez pela
mesma liberdade de falar o que quisesse (o que, na maioria das vezes, era o que
era preciso)
Mas esta
mesma liberdade fez com que, certa vez, enfrentasse – e vencesse – uma figura
que parecia ser um bicho papão, de tanto medo que tinham de sua
"gentileza" (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas, obrigado)
Sim, ele
mesmo: Silas Mala-Sem Alça-Faia.
Inclusive contamos a história deste enfrentamento em um post desta séria série. Mas não
custa nada lembrar.
1- junho de
2015, a menina Kailane Campos, então com 11 anos, e a sua avó caminhavam pela
rua, devidamente trajadas para o candomblé – sim, elas são fieis da principal
religião afro brasileira. Bastou isso para serem xingadas e apredejadas por um
bando de (se me permitem o termo) babacas intolerantes. Uma das pedras atingiu
a cabeça de Kailane.
A agressão
motivou Boechat a comentar sobre a intolerância religiosa estimulada por certos
pastores fundamentalistas na BandNews.
BOECHAT E A INTOLERANCIA RELIGIOSA
BandNews FM 17 jun.
2015
2- Nenhum
nome foi citado, mas alguém resolveu botar a carapuça: Silas Mala-Sem Alça-Faia,
com toda a sua "gentileza" habitual via Twitter:
Avisa ao jornalista Boechat, que está falando asneira, dizendo que pastores
incitam os fiéis a praticarem a intolerância. Verdadeiro idiota.
Desafio Boechat para um debate ao vivo. falar asneira no programa de rádio
sozinho, é mole, deixa de ser falastrão.Não incite o ódio .
3- Pra quê?
Silas Mala-Sem Alça-Faia descobriu que tentou intimidar a pessoa errada. Vale a
pena colocar a resposta já clássica de Ricardo Boechat a mais um tigre de
papel. (Abaixo, a transcrição – os grifos são meus.)
BOECHAT - "[O pastor Silas Malafaia],
figura que dispensa maiores apresentações...
LOCUTORA - Acabou de colocar no Twitter...
BOECHAT - ...acabou de colocar no Twitter dele
um desafio pra debater comigo ao vivo, pra eu 'parar de falar asneira no
programa de rádio sozinho, que é mole... deixa de ser falastrão... não incite o
ódio'. 'Avisa ao jornalista Boechat que está falando asneira, dizendo que
pastores incitam os fiéis a praticar intolerância... Verdadeiro idiota'... Ô Malafaia, vai procurar uma rola, vai. Não me enche o saco. Você é
um idiota, um paspalhão, um pilantra, tomador de grana de fiel,
explorador da fé alheia. E agora vai querer me processar pelo que eu
acabei de falar, que é o que você faz. Você gosta muito é de palanque. Eu não
vou te dar palanque porque tu é um otário, tu é um paspalhão. O que eu falei e
repito, e não vou partir pra debate com você porque não vou te dar confiança, é
o seguinte. Que é no âmbito de igrejas neopentecostais
que estão acontecendo atos de incitação à intolerância religiosa, mais do que
em outros ambientes. Em nenhum momento, é pegar minhas falas que estão
gravadas, eu disse qualquer coisa que generalizasse esse comentário, qualquer
coisa. Até porque, diferente de você,
não sou um idiota. Então você é um homofóbico, você é uma figura execrável,
horrorosa, e que toma dinheiro das pessoas a partir da fé. Você é rico. Eu
não sou rico porque tomei dinheiro das pessoas pregando salvação depois da
morte. O meu salário, os meus bens, o meu patrimônio, veio do meu suor, não
veio do suor alheio. Você é um charlatão cara, que usa o nome de Deus, de
Cristo, para tomar dinheiro dos fiéis. Você é tomador de grana. Você e muitos
outros. Tenho medo de você não, seu otário. Vai procurar uma rola, repetindo
em português bem claro. Bom...”
LOCUTOR - Posso chamar aqui...
BOECHAT - Só um minutinho... O pastor João Melo, da Igreja Batista Vila da Penha... onde tem três mil membros... e ali na Vila da Penha onde foi o ataque...
LOCUTOR - Foi em São João de Meriti...
LOCUTORA - ...da menina Kailane...
BOECHAT - ...Kailane... Kailane Campos e a avó dela, recentemente... o ataque de... que não se sabe ainda de quem foi... mas de intolerância religiosa, jogaram uma pedra na menina, levou três pontos na cabeça... o pastor João Melo me mandou uma mensagem pelo SMS... dizendo o seguinte... "Sou pastor da Primeira Igreja Batista em Vila da Penha, onde temos três mil membros, que fica no Largo do Bicão... e ontem"... portanto, antes mesmo do café da manhã do cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta, esta manhã... o pastor João Melo já tinha ontem recebido a menina Kailane, e a família da Kailane... "num gesto pra repudiar o ato de pessoas intolerantes que NÃO representam"... ele enfatiza aqui... " NÃO representam os evangélicos e muito menos o Cristo...Neste domingo, em vez de realizarmos o culto pela manhã, normalmente, como acontece sempre, estaremos participando da movimentação em favor da liberdade e da tolerância religiosa. Abraço, padre (SIC) João Mello." Esse é o tipo de pastor que nós respeitamos e doa quais precisamos pra conduzir os rebanhos de fiéis... é deste tipo de gente que estou falando quando falo que a igreja tem que tomar uma posição... assim como acho que as igrejas evangélicas também tem que tomar uma posição... atitudes como essa, dos pastor João Mello, e não de outros que tentam... criar uma confusãozinha pra crescer na área deles... vai crescer sozinho, malandro... em cima de mim não vai não."
LOCUTOR - Posso chamar aqui...
BOECHAT - Só um minutinho... O pastor João Melo, da Igreja Batista Vila da Penha... onde tem três mil membros... e ali na Vila da Penha onde foi o ataque...
LOCUTOR - Foi em São João de Meriti...
LOCUTORA - ...da menina Kailane...
BOECHAT - ...Kailane... Kailane Campos e a avó dela, recentemente... o ataque de... que não se sabe ainda de quem foi... mas de intolerância religiosa, jogaram uma pedra na menina, levou três pontos na cabeça... o pastor João Melo me mandou uma mensagem pelo SMS... dizendo o seguinte... "Sou pastor da Primeira Igreja Batista em Vila da Penha, onde temos três mil membros, que fica no Largo do Bicão... e ontem"... portanto, antes mesmo do café da manhã do cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta, esta manhã... o pastor João Melo já tinha ontem recebido a menina Kailane, e a família da Kailane... "num gesto pra repudiar o ato de pessoas intolerantes que NÃO representam"... ele enfatiza aqui... " NÃO representam os evangélicos e muito menos o Cristo...Neste domingo, em vez de realizarmos o culto pela manhã, normalmente, como acontece sempre, estaremos participando da movimentação em favor da liberdade e da tolerância religiosa. Abraço, padre (SIC) João Mello." Esse é o tipo de pastor que nós respeitamos e doa quais precisamos pra conduzir os rebanhos de fiéis... é deste tipo de gente que estou falando quando falo que a igreja tem que tomar uma posição... assim como acho que as igrejas evangélicas também tem que tomar uma posição... atitudes como essa, dos pastor João Mello, e não de outros que tentam... criar uma confusãozinha pra crescer na área deles... vai crescer sozinho, malandro... em cima de mim não vai não."
Como disse
antes: Há quem gostasse do que Ricardo Boechat dizia. Há quem não gostasse. Mas
só isso, para nós, já foi suficiente para que ele ganhasse o nosso respeito.
Agora, que
Ricardo Boechat vai fazer falta, ah, isso vai.
*********
E agora,
nossa indicação de filme para esta séria série: Los días más oscuros de nosotras (México, 2017), de Astrid
Rondero.
Eis a
sinopse:
Tudo o que Ana (Sophie Alexander-Katz) lembra do dia em que sua irmã
morreu é uma imagem fragmentada e nebulosa que a tem perseguido desde a
infância. Agora, Ana retornou a Tijuana, sua cidade natal, onde terá que
enfrentar a dor e a escuridão de sua memória.
Ana desce a rua de sua casa de infância e começa a espionar sua nova
inquilina, Silvia (Florencia Ríos), que tem sua própria obsessão pela casa e
quer comprá-la.
Vejam o
trailer, e até a próxima.
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