Sim,
amiguinhos, como disse há uns três posts atrás, estou republicando os textos do
Diário do Bolso, de José Roberto
Torero, como a mais sincera homenagem aos bolsonaretes mais cretinos (isto é,
os que não tem senso de humor) e à mãe do algoritmo censor do Feiceburro, que
lhes atendeu o breve pedido de excluí-los da rede social.
Foi preciso um festival de
explicações e xingamentos à mãe de Mark Zuckenberg (coitada da mãe dele...) para
que os textos voltassem ao Feiceburro – agora em fanpage própria – justamente, Diário do Bolso.
Mesmo
assim, vamos continuar republicando tais textos aqui. Vai que o algoritmo dê
uma de censor de novo...
Diário do Bolso - 4
(José
Roberto Torero)
9 de
janeiro de 2019.
Diário,
hoje eu sonhei um sonho. Um sonho bem estranho. Esquisitão mesmo!
E
como eu sei que as pessoas escrevem seus sonhos nos diários, vou escrever o meu
aqui.
A
primeira coisa que eu lembro é que eu estava voando, que nem nos meus sonhos de
adolescente. Mas desta vez foi diferente. Em vez de ser o Super-Homem, eu tinha
uma enorme capa preta. Opa! Não, não era bem uma capa. Era mais um manto bem
comprido e esfarrapado. E eu segurava alguma coisa na mão. Tipo uma varinha
mágica gigante.
Eu
voava bem alto. A minha sombra era enorme, cobria tudo. E ela tinha uma espécie
de superpoder: por onde a sombra passava, as coisas mudavam.
Por
exemplo, eu passei em cima de uma floresta e ela virou uma plantação de soja.
Depois
eu passei em cima de uma aldeia de índios, e todos eles secaram e viraram
esqueletos. Uns esqueletos cheios de penas. Coisa bonita mesmo.
Aí
voei por cima de uns quilombolas bem gordos. O afrodescendente mais leve pesava
sete arrobas. Então minha sombra passou em cima deles e eles deixaram de ser
pretos. Foram clareando até ficarem cinza. Só depois eu notei que o cinza era
porque eles tinham se transformado em cinzas mesmo. É que bateu um vento e eles
começaram a se desfazer como se fossem estátuas de areia.
E
teve uma coisa que foi um pouco diferente. Eu vi um arco-íris e pensei: vou
atravessar essa coisa. Passei bem pelo meio dele. Depois eu olhei para trás e o
arco-íris tinha ficado negro. Demais!
Outro
negócio louco é que tinha umas pessoas dançando e cantando. E olhando lá de
cima, eles formavam um “S”. Um “S” gigante. Mas aí minha sombra transformou o
“S” numa cobra. E a cobra comeu todo mundo.
Teve
também uma turma com faixas e bandeiras. Era uma turma de jovens. Quando a minha
sombra mágica passou por eles, todos viraram estátuas. Mas não eram estátuas de
bronze, nem de ferro. Eram daquelas marrons, que nem os nordestinos fazem.
Na
sequência eu vi uma fila de velhos e velhas. Todos de bengala. Tipo fila de
INPS (ainda existe INPS?). Bom, quando a minha sombra passou em cima deles,
todas as bengalas pegaram fogo. E depois, eles também. Ficou um monte de
fogueirinha. Um negócio lindo de se ver.
Aí
voei por cima do Rio de Janeiro. Quando minha sombra passou pelo Redentor, o
Cristo fez revolvinho com as duas mãos e riu para mim. Legal!
Ah,
lembrando agora deu pra ver que o que eu tinha na mão não era uma varinha
mágica. Era uma foice. Será que eu era um comunista? Deve ser isso. Eu era um
comunista e por isso tudo morria.
Bom,
diário, vou para por aqui porque contar sonho é coisa de boiola. Mas foi um
negócio muito estranho.
Nem
sei direito se foi pesadelo ou sonho. Mas eu gostei.
*********
Baseado no conto Jambula
Tree, da escritora ugandense Monica Arac de
Nyeko, Rafiki fala do amor de duas jovens que são filhas de
políticos rivais. Kena (Samantha Mugatsia) é tímida e quieta, anda basicamente
com colegas homens e tenta manter a paz entre os pais divorciados. Ziki (Sheila
Munyiva) gosta de dançar, tem espírito livre e cabelos coloridos. Em comum, as
duas têm a vontade de ir além dos papéis atribuídos às jovens quenianas. Seus
sonhos incluem cursar a universidade e viajar pelo mundo – ou seja, tomar
caminhos diferentes dos de seus pais. Mas no meio do caminho das garotas tinha
uma pedra – a sociedade conservadora queniana, que responde de forma violenta à
crescente intimidade entre Kena e Ziki.
O trailer pode ser visto aqui.
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