08 fevereiro, 2019

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LXXXIII)

Sim, amiguinhos, como disse há uns três posts atrás, estou republicando os textos do Diário do Bolso, de José Roberto Torero, como a mais sincera homenagem aos bolsonaretes mais cretinos (isto é, os que não tem senso de humor) e à mãe do algoritmo censor do Feiceburro, que lhes atendeu o breve pedido de excluí-los da rede social.
Foi preciso um festival de explicações e xingamentos à mãe de Mark Zuckenberg (coitada da mãe dele...) para que os textos voltassem ao Feiceburro – agora em fanpage própria – justamente, Diário do Bolso.
Mesmo assim, vamos continuar republicando tais textos aqui. Vai que o algoritmo dê uma de censor de novo...

Diário do Bolso - 4
(José Roberto Torero)
9 de janeiro de 2019.

Diário, hoje eu sonhei um sonho. Um sonho bem estranho. Esquisitão mesmo!
E como eu sei que as pessoas escrevem seus sonhos nos diários, vou escrever o meu aqui.
A primeira coisa que eu lembro é que eu estava voando, que nem nos meus sonhos de adolescente. Mas desta vez foi diferente. Em vez de ser o Super-Homem, eu tinha uma enorme capa preta. Opa! Não, não era bem uma capa. Era mais um manto bem comprido e esfarrapado. E eu segurava alguma coisa na mão. Tipo uma varinha mágica gigante.
Eu voava bem alto. A minha sombra era enorme, cobria tudo. E ela tinha uma espécie de superpoder: por onde a sombra passava, as coisas mudavam.
Por exemplo, eu passei em cima de uma floresta e ela virou uma plantação de soja.
Depois eu passei em cima de uma aldeia de índios, e todos eles secaram e viraram esqueletos. Uns esqueletos cheios de penas. Coisa bonita mesmo.
Aí voei por cima de uns quilombolas bem gordos. O afrodescendente mais leve pesava sete arrobas. Então minha sombra passou em cima deles e eles deixaram de ser pretos. Foram clareando até ficarem cinza. Só depois eu notei que o cinza era porque eles tinham se transformado em cinzas mesmo. É que bateu um vento e eles começaram a se desfazer como se fossem estátuas de areia.
E teve uma coisa que foi um pouco diferente. Eu vi um arco-íris e pensei: vou atravessar essa coisa. Passei bem pelo meio dele. Depois eu olhei para trás e o arco-íris tinha ficado negro. Demais!
Outro negócio louco é que tinha umas pessoas dançando e cantando. E olhando lá de cima, eles formavam um “S”. Um “S” gigante. Mas aí minha sombra transformou o “S” numa cobra. E a cobra comeu todo mundo.
Teve também uma turma com faixas e bandeiras. Era uma turma de jovens. Quando a minha sombra mágica passou por eles, todos viraram estátuas. Mas não eram estátuas de bronze, nem de ferro. Eram daquelas marrons, que nem os nordestinos fazem.
Na sequência eu vi uma fila de velhos e velhas. Todos de bengala. Tipo fila de INPS (ainda existe INPS?). Bom, quando a minha sombra passou em cima deles, todas as bengalas pegaram fogo. E depois, eles também. Ficou um monte de fogueirinha. Um negócio lindo de se ver.
Aí voei por cima do Rio de Janeiro. Quando minha sombra passou pelo Redentor, o Cristo fez revolvinho com as duas mãos e riu para mim. Legal!
Ah, lembrando agora deu pra ver que o que eu tinha na mão não era uma varinha mágica. Era uma foice. Será que eu era um comunista? Deve ser isso. Eu era um comunista e por isso tudo morria.
Bom, diário, vou para por aqui porque contar sonho é coisa de boiola. Mas foi um negócio muito estranho.
Nem sei direito se foi pesadelo ou sonho. Mas eu gostei.

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Já que o governo do Coiso se diz "democrático" e "contra ditaduras", creio que ele não se incomodará de ver aqui em Terra Papagalli o filme que indico aqui nesta séria série, exibido na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo de 2018: Rafiki (Friend - Quênia, 2018), de Wanuri Kahiu – proibido no próprio Quênia (não vale rir, apesar do motivo ridículo) "por sua temática homossexual e clara intenção em promover o lesbianismo no Quênia". (Pois é. O Quênia, desde sua independência, em  , não é um primor de democracia – com presidentes que ficam no cargo por mais de trinta anos... E os pastores evangelicuzinhos fundamentalistas estão lá no Quênia – e em vários outros países da África – como a jararaca do samba de Almir Guineto depois que mataram a jiboia: deitando e rolando. E só por isso Rafiki foi proibido em seu próprio país. O fato de ter sido o primeiro filme queniano a ser exibido no Festival de Cannes de 2018 não diz nada para estes lorpas e pascácios.)
Baseado no conto Jambula Tree, da escritora ugandense Monica Arac de Nyeko, Rafiki fala do amor de duas jovens que são filhas de políticos rivais. Kena (Samantha Mugatsia) é tímida e quieta, anda basicamente com colegas homens e tenta manter a paz entre os pais divorciados. Ziki (Sheila Munyiva) gosta de dançar, tem espírito livre e cabelos coloridos. Em comum, as duas têm a vontade de ir além dos papéis atribuídos às jovens quenianas. Seus sonhos incluem cursar a universidade e viajar pelo mundo – ou seja, tomar caminhos diferentes dos de seus pais. Mas no meio do caminho das garotas tinha uma pedra – a sociedade conservadora queniana, que responde de forma violenta à crescente intimidade entre Kena e Ziki.
O trailer pode ser visto aqui.


 

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