Diário do Bolso
– 15
(José Roberto
Torero)
Caro Diário, não
morri.
A operação foi
um sucesso. Meu intestino já está costurado. Só espero que a emenda não
estoure, senão vou ficar que nem Brumadinho, rarrarrá!
Pô, esse
desastre vai ser ótimo para o pessoal me esquecer um pouco. Nada como um mar de
lama para encobrir outro. E ficar no hospital também vai ajudar. Por mim eu
passava quatro anos aqui, sem dar entrevista nem fazer reunião. Mas vão ser só
uns dez dias. Que pena...
O chato é que os
militares me encheram o saco e eu tive que passar o cargo para o Mourão. Meu
medo é que ele pegue gosto pela coisa.
Modéstia à
parte, achei que foi uma boa sacada pedir ajuda do Benjamim Nataniel. Mas já
tem pentelho dizendo que eu não quis médico cubano mas aceitei soldado
israelense. É difícil agradar os esquerdopatas.
Eles estão
escrevendo os maiores absurdos na internet. Dizem que eu devia prender o
presidente da Vale e que eu devia reestatizar a empresa. Uns loucos! Todo mundo
sabe que a Vale nem paga multa. Só no Espírito Santo são umas vinte. E como é
que eu vou ser contra mineradora? A Flapa, por exemplo, praticamente obrigou
que seus empregados votassem em mim, porque colocou no seu mural que se eu não
fosse eleito a empresa fechava. São gente boa, pô.
A saída vai ser
pegar um pato qualquer, tipo o auditor que disse que estava tudo ok. Ou então
aquele secretário do meio ambiente de Minas Gerais, o tal do Germano Vieira. Se
bem que ele deve ser amigo das mineradoras, porque entrou na gestão do petê e
continuou com o Zema.
Bom, o que a
gente tem que fazer é mostrar pros cidadões (eu falava cidadãos, mas o cara do
Enem me explicou o certo) que estamos fazendo uma “colheita de provas” (essa
foi o Moro que me ensinou) para apurar o que aconteceu com a bagagem de
dejeitos.
Aí, quem sabe?,
os vermelhos da internet se acalmam um pouco. Se bem que eles não tem dó de
ninguém. Vi gente postando que a minha cirurgia era de alto risco porque
separar gêmeos siameses é sempre perigoso.
Eu devia ter um
saquinho de plástico só para esses chatos encherem. Em vez de bolsa de
colostomia ia ser bolsa de comunistomia, rarrarrá!
Bom, Diário,
agora eu vou ler um pouquinho. Eu não gosto muito de livro, que ler é coisa de
viado, mas este parece bom. O nome é “Memórias de um sargento de milícias”.
Deve ter um monte de tiroteio.
Até amanhã.
*********
Ainda sobre
a morte trágica de Ricardo Boechat em acidente de helicóptero:
1- Juro que
gostaria de saber, afinal de contas, para que realmente serve a Agência
Nacional de Aviação Civil.
Oficialmente,
a ANAC serve para
É isso
mesmo?
Ou é, pura
e simplesmente para confessar a sua própria incompetência no cumprimento de
suas funções, quando ocorre uma (com o perdão do termo) merda fenomenal – tipo
assim, um acidente aéreo de grande repercussão?
Eis que a ANAC nos informa em nota oficial:
"A empresa RQ Serviços
Aéreos Ltda foi autuada, em 2011, por veicular propaganda oferecendo o serviço
de voos panorâmicos em aeronave e por meio de empresa não certificada para a
atividade. Essa atividade só pode ser executada por empresas e aeronaves certificadas
na modalidade táxi aéreo. A autuação foi definida em R$ 8 mil reais e foi paga
pela empresa."
Isto é: a
empresa pagou a multa, continuou fazendo as atividades de transporte aéreo que
não deveria fazer... e a ANAC ficou fazendo sua cara de paisagem habitual até o
acidente fatal.
O mais
irônico nesta história é que a própria morte de Boechat confirmou o que ele
próprio comentou em seu último comentário no seu programa de rádio na BandNews –
justamente sobre a impunidade após tragédias como a queda do vôo JJ 3054 da TAM,
em Congonhas (2007), o incêndio da boate Kiss, em Santa Maria (RS - 2013), o rompimento
das barragens de Mariana (MG - 2015) e de Brumadinho (MG - 2019) e o incêndio
no Ninho do Urubu (RJ - 2019) – a partir
de matéria do jornal O Globo.
É o chamado
ciclo trágico brasileiro:
Negligência causa tragédia.
Tragédia é esquecida.
Esquecimento gera impunidade.
Impunidade estimula a negligência.
Nova negligência causa nova tragédia.
E por aí vai...
BOECHAT & O TRÁGICO CICLO BRASILEIRO
Canal Meteoro Brasil (YouTube)
- A síntese desse
levantamento feito pelo Globo é que as consequências não deram em nada. Esse é
o ponto que une todas essas tragédias – disse o jornalista. – A impunidade é o
que rege, o que comanda as orquestras das tragédias nacionais.
Ao longo do
comentário de 11 minutos, retransmitido no programa "Café com
Jornal", da TV Band, Boechat cobra a responsabilização daqueles que
considera envolvidos na tragédia de Brumadinho: a Vale, os órgãos de
fiscalização e a Justiça, por não dar punições adequadas.
- É preciso que as
ações sejam mais rápidas no campo policial no campo do Ministério Público para
que não fique no oba-oba, depois apoiado pelo esquecimento, pela nossa velha
tradição de deixar para lá e tocar adiante, não produzir manchetes como essa
toda semana: negligência e impunidade.
2- Até
agora, não chegou até nós mensagem sobre a morte de Ricardo Boechat de Silas
Mala-sem-Alça-Faia – sim, ele mesmo, o pastor que irritou tanto Ricardo Boechat
com sua "gentileza" característica que o mandou procurar uma rola...
Mas já apareceram comentários de alguns de seus fiéis – aparentemente, tão escrotos como seu pastor – comemorando com palmas e pedindo bis a morte de Boechat.
A seguir,
alguns destes comentários no Twitter – com os nomes, para ver se envergonham de
se dizer cristãos depois disso:
Davi Elaine
"Ninguém se
levanta contra os ungidos do Senhor dos Exercitos" (SIC)
Michel da Costa
Oliveira
"Ai daquele que
mexer com um ungido meu. Está escrito na santa palavra de DEUS."
Camila Amorim
"Segundo
notícias acabou de falecer o jornalista Ricardo Boechat, num acidente de avião (SIC). Eu sempre digo: NÃO TOQUE NAS PESSOAS
UNGIDAS POR DEUS. Eu não esqueço o que ele falou pro pastor Silas Malafaia na
reportagem..."
Nossa...
como são "cristões" e "piedosos", não é mesmo?
"Cristões"?
É, assim
mesmo, sr. revisor, obrigado, para diferenciar dos cristãos de verdade que
reagiram a tamanha escrotidão. Vão aí dois comentários criatãos de verdade (e
só lamento não saber de quem são, para divulgar aqui):
PERFIL 1
"Cristãos, não passem vergonha comemorando a morte do Boechat
porque ele era ateu e mandou o Malafaia procurar uma rola. Façam seus papéis
como cristãos, se são isso mesmo, e orem pela família do cara. Vocês são a
vergonha do Cristianismo Brasileiro".
PERFIL 2
"Existe uma problema sério entre os evangélicos brasileiros. Gente
que acha que o pastor é intocável e não pode ser criticado. Gente estúpida a
ponto de dizer que foi "Deus pesou a mão" no Boechat por críticas ao
Malafaia. Mas por favor não tomem essa galera como se fosse o todo".
Agora...
Sabe esta
história de neguinho se declarando "ungido do Senhor", intocável aqui
na Terra?
Lembra de
um trecho da letra do Samba da
bênção, de Vinicius de Moraes (o grifo é meu):
Cuidado,
companheiro
A vida é
pra valer
E não se
engane não, tem uma só
Duas mesmo que é bom ninguém vai me dizer que tem sem provar muito bem
provado
Com certidão passada em cartório do céu e assinado embaixo
Deus, e com firma reconhecida
Samba da Bênção – Vinícius de Moraes
Pois então... Só acreditarei que este ou aquele pastor é
"ungido" por Deus quando alguém me trouxer um "diploma de ungido
do Senhor" assinado por Ele próprio, com carimbo, firma reconhecida, selo
oficial etc.
Ah, sim: junto com o "diploma
de ungido do Senhor", quero que alguém me traga alguma instrução normativa
Dele, explicando a nós, meros mortais, como alguém pode ser "ungido pelo Senhor"?
Quais os critérios Dele para selecionar quem pode ou não pode ser
"ungido" por ele? Por que um "ungido do Senhor" é imune a críticas e
punições aqui na Terra? Por que não se pode apontar seus erros, quando ele
errar ou cometer crimes – tipo assim, lavar dinheiro criminoso, como o próprio Silas Mala-Sem-Alça-Faia?
Aliás,
quais os critérios do próprio Silas Mala-sem-Alça-Faia para se achar
"ungido do Senhor" e se achar imune a qualquer julgamento?
pastor silas malafaia intimida fiéis para não
denunciarem pastores ladrões
(YouTube)
Até lá, um breve recado ao bando de fiéis de Silas Mala-Sem-Alça-Faia que seja tão
babaca e escroto quanto ele: VAI PROCURAR UMA ROLA, vai!
*********
Lembram quando indicamos um
filme de Bollywood – Ek Ladki Ko Dekha Toh
Aisa Laga (How I felt when I saw that
girl / Como eu me senti quando vi
aquela garota - Índia, 2019), de Shelly
Chopra Dhar – em um post recente desta séria série? Pois é. Acho que vocês
lembram o que dissemos: quando a Suprema Corte da Índia descriminalizou a homossexualidade em setembro de 2018, (em inglês, no The Guardian), acabou com uma proibição que vinha desde o domínio britânico. Infelizmente,
também lembram que a homofobia é um troço difícil de acabar na sociedade
tradicional indiana – assim como os casamentos arranjados. Adivinhem qual a
solução homofóbica básica para "curar" esta "doença" (assim
mesmo, sr. revisor, porque homossexualidade nunca foi doença nem nas clínicas
picaretas de Silas Mala-Sem-Alça-Faia – obrigado)? Isso mesmo: o "estupro
corretivo".
É disto que se trata a
sinopse de Satyavati (Índia, 2016), de Deepthi Tadnaki.
A
historinha é a seguinte:
Três moças
– Manvi (Shwetha Gupta), Satya (Sira Ushapp) e Iti (Iti Acharya) – moram
juntas. Mas só duas delas mantém uma relação amorosa. A terceira não deve estar
nem aí para o romance de suas colegas de casa.
Mas os pais da terceira moça, sim – e suspeitam que sua filha também
seja lésbica.
Adivinhem qual a "brilhante" ideia que os pais da jovem tem? Um
"estupro corretivo" e coletivo – fazer com que o tio e amigos dela
estuprem as três moças, para que (não vale rir, nem xingá-los de burros, porque
eles não vão se retratar mesmo) elas percebam o seu "erro", se "curem"
do lesbianismo e comecem a pensar de um modo "normal".
A história de Satyavati, claro, é ficção, mas se baseia em
diversos casos de "estupro corretivo" – não só (mas
principalmente) na Índia, mas em todo o mundo, e pela mesma razão.
A partir daí, o filme mostra as consequências devastadoras dessa ação e
como as personagens chegam a um acordo com a vida após o trauma.
Fiquem com
o trailer, e até a próxima.
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